O Pagador de promessas

Dias Gomes

Dias Gomes

Le théâtre contemporain - O Teatro contemporâneo

O autor

Dias Gomes

Adaptado - Wikipédia

Alfredo de Freitas Dias Gomes nasceu em Salvador, na Bahia, no dia 19 de outubro de 1922 e faleceu num acidente em São Paulo, em 18 de maio de 1999.
Foi romancista, dramaturgo, autor de telenovelas e membro da Academia Brasileira de Letras.
Homem de teatro, aos quinze anos Dias Gomes escreveu sua primeira peça, a Comédia dos Moralistas. Em 1941, sua peça Amanhã Será Outro Dia chega às mãos do ator Procópio Ferreira. Tratava-se de um drama antinazista e Procópio achava arriscado levar à cena um espetáculo desse porte em plena Segunda Guerra Mundial. Quando questionado se não teria uma outra peça, Dias lembrou-se de Pé de Cabra e o ator, entusiasmado, comprometeu-se a encená-la.

A peça Pé de Cabra, que possuía alto conteúdo marxista, foi proibida no dia da estreia. Procópio consegue a liberação da peça, mediante o corte de algumas passagens. No ano seguinte, Dias Gomes assinaria com Procópio um contrato no qual se comprometia a escrever com exclusividade para o ator. Desse período nasceram Zeca Diabo, João Cambão, Dr. Ninguém, Um Pobre Gênio e Eu Acuso o Céu. Mas Dias e Procópio desentenderam-se por sérias divergências políticas. Refletindo o pensamento da época, Procópio não concordava com as preocupações sociais que Dias insistia em discutir em suas peças.

De 1944 a 1964, Dias Gomes adaptou cerca de 500 peças teatrais para o rádio, o que lhe proporcionou apurado conhecimento da literatura universal. Em 1960 Dias Gomes volta aos palcos com aquele que viria a ser o maior êxito de sua carreira : a peça teatral O Pagador de Promessas. Adaptada para o cinema por Anselmo Duarte, O Pagador seria o primeiro filme brasileiro a receber uma indicação ao Oscar e o único a ganhar a Palma de Ouro em Cannes.

Em 1965, Dias assiste, perplexo, à proibição de sua peça O Berço do Herói, no dia da estreia. Adaptada para a televisão com o nome de Roque Santeiro, a mesma seria proibida uma década depois, também no dia de sua estreia. Somente em 1985, com o fim do Regime Militar, o público iria poder conferir a Roque Santeiro - que viria a se tornar uma das maiores audiências do gênero.

Com a implantação da Ditadura Militar no Brasil, em 1964, Dias Gomes passa a ter suas peças censuradas, uma após a outra. Demitido da Rádio Nacional, graças ao seu envolvimento com o Partido Comunista, não lhe resta outra saída senão aceitar o convite de Boni, então presidente da Rede Globo, para escrever para a televisão.

Estreou na Globo em 1969, com a novela A Ponte dos Suspiros.
De 1969 a 1979 Dias Gomes dedica-se exclusivamente ao veículo, no qual demonstra incomum talento.
Em 1973 escreveu a primeira novela a cores da televisão brasileira, O Bem Amado.
Em 1974 já falava em ecologia e no crescimento desordenado da cidade com O Espigão.
Em 1976, com Saramandaia, abordaria o realismo fantástico, então em moda na literatura.
O fracasso de Sinal de Alerta, em 1978, leva Dias a se afastar do gênero telenovela temporariamente.

Ao longo da década de 1980, Dias Gomes voltou a se dedicar ao teatro. Datam desse período os seriados O Bem Amado e Carga Pesada, e as novelas Roque Santeiro e Mandala, das quais escreveria apenas parte.
Nos anos 90, Dias Gomes viraria as costas de vez para as telenovelas, dedicando-se única e exclusivamente às minisséries.

Introduction

En guise d’introduction - Analyse filmique

Exercice d’expression orale / Compréhension de l’image

Problématiques

Problématiques : Thématique 1 - Le théâtre contemporain

Lecture cursive – Lecture analytique de la pièce O Pagador de promessas - Dias Gomes (Œuvre complète)

Perspectives d’études : Le genre théâtral au service de la peinture de la société dans l’œuvre de Dias Gomes

 La place de la femme et le rêve féminin dans la société brésilienne de l’époque (de la campagne à la ville)
 La figure du « Sertanejo » ; la figure du « Malandro » ; la figure du « Padre »
 Réforme agraire : opinion, politique et propagande (Communisme et pouvoir en place ; rôle de la presse)
 Réforme agraire : le peuple « sans terre » face aux autres
 Syncrétisme religieux et intolérance : pouvoir et religion - le pouvoir de l’église
 Brésil, Brésils : monde rural, monde urbain (Salvador – Bahia)
 La « parole donnée » et le couple (Foi et syncrétisme religieux - Mariage)
 Peinture des mœurs : La figure du « Malandro »
 Critique sociale et ironie chez Dias Gomes
 Synthèse : peinture de la société et critique sociale, politique et religieuse dans la pièce de Dias Gomes

Contexte

Contextualização

Questão : Zé do burro, um homem ingénuo movido pela fé ou pelo empirismo social e político ?

Primeira chave para resolver a questão : a contextualização

1. A Reforma agrária - Definições

Reforma agrária é o termo utilizado para designar a redistribuição fundiária (agrária ou de terras) em um Estado. Quando há a concentração de terras nas mãos de uma pessoa ou poucas pessoas, temos a formação dos latifúndios (grandes propriedades de terra que, por sua extensão, não são devida e completamente exploradas).

Os latifúndios fazem com que a terra não tenha seu valor social cumprido e acarretam a desigualdade social ao servirem apenas como fonte de enriquecimento para especuladores de imóveis. A reforma agrária visa, em sua essência, a uma distribuição fundiária mais justa que contemple os agricultores menores e menos poderosos, que, em geral, praticam a agricultura e a pecuária familiar.

2. O que é reforma agrária

A reforma agrária é um tipo de reforma de base, ou seja, uma reestruturação ou mudança que afeta diretamente as bases da sociedade. A palavra “reforma” remete à melhoria ou mudança, enquanto o termo “agrária” designa estrutura fundiária, ou seja, estrutura de organização das terras de um Estado nacional.

3. Um pouco de história

A Europa e suas colônias formaram-se em cima de estruturas latifundiárias, ou seja, com a posse da terra sendo exercida por poucas pessoas. Na Modernidade, o iluminismo (corrente teórico filosófica de pensamento político que surgiu na França no século XVIII) trouxe a ideia de que a terra era um bem comum a todos que exercem a cidadania em um Estado, portanto, deve-se reconhecê-la como um bem que possui um valor social.

O valor social da terra sustenta a ideia de que deve haver a plena utilização das propriedades agrárias para a produção de alimentos e bens de consumo e a extração de recursos naturais e energia, a fim de que toda a população seja contemplada pelos bens proporcionados por ela. Nesse sentido, a formação de latifúndios não explora a terra do modo como ela deve ser e exclui aquelas pessoas que podem produzir apenas em pequena escala da cadeia produtiva.

4. Primeira reforma agrária no mundo

A Revolução Francesa foi o primeiro grande movimento político de reforma agrária da Modernidade. No Antigo Regime, em que a política era comandada por uma casta nobre e a participação do clero era direta e efetiva, a terra estava distribuída na França (e nos países europeus em geral) apenas entre a nobreza e o clero. Alguns burgueses também tinham propriedades de terra, mas essa possibilidade de posse era bem restrita e estava submetida à vontade da nobreza de vender suas propriedades.

5. História da reforma agrária no Brasil

A concentração fundiária no Brasil teve início em 1530, com a formação das capitanias hereditárias, que eram faixas de terras brasileiras, e sua doação aos capitães donatários. Os capitães tinham a missão de colonizar o território e produzir nele, e tinham, como contrapartida, que pagar o equivalente a um sexto da produção em impostos à Coroa Portuguesa.

No princípio eram apenas 14 as capitanias hereditárias, distribuídas a homens que tinham condições de produzir em terras brasileiras. No entanto, o sistema de colonização não deu certo. Alguns capitães donatários desistiram da atuação ou não quiseram arcar com os altos custos de viagem e produção em terras brasileiras. Ainda assim o território estava concentrado nas mãos de poucos.

A partir da independência do Brasil, em 1822, as terras passam a ser geridas por aqueles que tinham maior poder econômico e político. A nobreza e a alta burguesia continuaram detentoras da maior parte das terras, o que resultou num sistema desigual baseado no latifúndio e existente até os dias atuais.

Após 1850 foi implantada a Lei de Terras, que resultou em práticas de apropriação e anexação de terras por grandes proprietários via falsificação de documentos de escrituração imobiliária (prática conhecida como grilagem de terras)[1]. Em outros países capitalistas, a concentração fundiária foi eliminada ou reduzida como maneira de estimular a produção capitalista liberal. No Brasil, no entanto, a concentração fundiária ainda perdura.

6. O MST (1984 …)

[1] A grilagem consiste na anexação ou posse de terras com a forja de documentos de escrituração (documentos que comprovam a legítima propriedade da terra a uma pessoa). Os grileiros forjavam os documentos e guardavam-nos em uma gaveta ou caixa com grilos, o que dá ao papel um aspecto envelhecido. Assim muitas terras públicas foram arrendadas de maneira ilegal por posseiros que afirmavam terem-nas adquirido ou herdado de antepassados.

Fonte - Adaptação

https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/reforma-agraria.htm
https://www.google.com/amp/s/m.monografias.brasilescola.uol.com.br/amp/sociologia/reforma-agraria.htm

Extraits

Seleção de trechos

O Pagador de promessas

Personagens

Personagens

Personagens

Zé-do-Burro
Rosa
Marli
Bonitão
Padre
Sacristão
Guarda
Beata
Galego
Minha Tia
Repórter
Fotógrafo
Dedé Cospe-Rima
Secreta
Delegado
Mestre Coca
Monsenhor
Manoelzinho Sua-Mãe
e a Roda de Capoeira

Exercício : Análise dos personagens

Exercício - Personagens : quem são ?

Análise dos personagens

PersonagensCaracterísticas sociaisAspetos físicosAspetos psicológicos Ação
Zé-do-Burro Lavrador / Roça Ingênuo
Rosa Esposa / Roça
Marli Prostituta / Cidade
Bonitão Cafetão / Cidade
Padre Se opõe a Zé
Sacristão
Guarda
Beata
Galego
Minha Tia
Repórter Transforma a realidade
Fotógrafo
Dedé Cospe-Rima
Secreta
Delegado
Mestre Coca
Monsenhor
Manoelzinho Sua-Mãe
e a Roda de Capoeira

Lugar - Época

Lugar - Época

Lugar - Época

Ação : Salvador
Época : Atual (= isto é…………………….. )

Primeiro Ato - Primeiro Quadro

Primeiro Ato - Primeiro Quadro

Primeiro Ato - Primeiro Quadro

Primeiro Ato - Primeiro Quadro - 1 (Indicações cênicas)

Encenação - Dramatização - Indicações cênicas [1]

Uma descrição objetiva [2]

Ao subir o pano [3], a cena está quase às escuras. Apenas um jato de luz, da direita, lança alguma claridade sobre o cenário [4]. Mesmo assim, após habituar a vista, o espectador identificará facilmente uma pequena praça, onde desembocam duas ruas. Uma à direita, seguindo a linha da ribalta [5], outra à esquerda, ao fundo, de frente para a platéia [6], subindo, encadeirada e sinuosa, no perfil de velhos sobrados coloniais [7]. Na esquina da rua da direita, vemos a fachada de uma igreja relativamente modesta, com uma escadaria de quatro ou cinco degraus [8]. Numa das esquinas da ladeira [9], do lado oposto, há uma vendola, onde também se vende café, refresco, cachaça etc. ; a outra esquina da ladeira é ocupada por um sobrado cuja [10] fachada forma ligeira barriga pelo acúmulo de andares não previsto inicialmente. O calçamento da ladeira é irregular e na fachada dos sobrados vêem-se alguns azulejos estragados pelo tempo. Enfim, é uma paisagem tipicamente baiana, da Bahia velha e colonial, que ainda hoje resiste à avalancha urbanística moderna.

Devem ser, aproximadamente, quatro e meia da manhã. Tanto a igreja como a vendola estão com suas portas cerradas. Vem de longe o som dos atabaques [11] dum candomblé [12] distante, no toque de Iansan [13]. Decorrem alguns segundos até que Zé-do-Burro surja, pela rua da direita, carregando nas costas uma enorme e pesada cruz de madeira. A passos lentos, cansado, entra na praça, seguido de Rosa, sua mulher. Ele é um homem ainda moço, de 30 anos presumíveis, magro, de estatura média. Seu olhar é morto, contemplativo. Suas feições transmitem bondade, tolerância e há em seu rosto um “quê” de infantilidade. Seus gestos são lentos, preguiçosos, bem como sua maneira de falar. Tem barba de dois ou três dias e traja-se decentemente, embora sua roupa seja mal talhada e esteja amarrotada e suja de poeira. Rosa parece pouco ter de comum com ele. É uma bela mulher, embora seus traços sejam um tanto grosseiros, tal como suas maneiras. Ao contrário do marido, tem “sangue quente”. É agressiva em seu “sexy”, revelando, logo à primeira vista, uma insatisfação sexual e uma ânsia recalcada de romper com o ambiente em que se sente sufocar. Veste-se como uma provinciana que vem à cidade, mas também como uma mulher que não deseja ocultar os encantos que possui.

Zé-do-Burro vai até o centro da praça e aí pousa a sua cruz, equilibrando-a na base e num dos braços, como um cavalete. Está exausto. Enxuga o suor da testa.

Primeiro Quadro - 2 (Diálogo entre Zé e Rosa)

Primeiro Quadro - 2 (Diálogo)

Primeiro Quadro - 2 (Diálogo)

ZÉ - (Olhando a igreja) É essa. Só pode ser essa.
(Rosa pára também, junto aos degraus, cansada, enfastiada e deixando já entrever uma revolta que se avoluma).

ROSA - E agora ? Está fechada.

ZÉ - É cedo ainda. Vamos esperar que abra.

ROSA - Esperar ? Aqui ?

ZÉ - Não tem outro jeito.

ROSA - (Olha-o com raiva e vai sentar-se num dos degraus. Tira o sapato).
Estou com cada bolha d’água no pé que dá medo.

ZÉ - Eu também. (Contorce-se num rito de dor. Despe uma das mangas do paletó). Acho que os meus ombros estão em carne viva.

ROSA - Bem feito. Você não quis botar almofadinhas, como eu disse.

ZÉ - (Convicto) Não era direito. Quando eu fiz a promessa, não falei em almofadinhas.

ROSA - Então : se você não falou, podia ter botado ; a santa não ia dizer nada.

ZÉ - Não era direito. Eu prometi trazer a cruz nas costas, como Jesus. E Jesus não usou almofadinhas.

ROSA - Não usou porque não deixaram.

ZÉ - Não, nesse negócio de milagres, é preciso ser honesto. Se a gente embrulha o santo, perde o crédito. De outra vez o santo olha, consulta lá os seus assentamentos e diz :
- Ah, você é o Zé-do-Burro, aquele que já me passou a perna ! E agora vem me fazer nova promessa. Pois vá fazer promessa pro diabo que o carregue, seu caloteiro duma figa ! E tem mais : santo é como gringo, passou calote num, todos os outros ficam sabendo.

Será que você ainda pretende fazer outra promessa depois desta ?…

Será que você ainda pretende fazer outra promessa depois desta ?…

ROSA - Será que você ainda pretende fazer outra promessa depois desta ? Já não chega ?…

ZÉ - Sei não… a gente nunca sabe se vai precisar. Por isso, é bom ter sempre as contas em dia.
(Ele sobe um ou dois degraus. Examina a fachada da igreja à procura de uma inscrição).

ROSA - Que é que você está procurando ?

ZÉ - Qualquer coisa escrita… pra a gente saber se essa é mesmo a igreja de Santa Bárbara.

ROSA - E você já viu igreja com letreiro na porta, homem ?

ZÉ - É que pode não ser essa…

ROSA - Claro que é essa. Não lembra o que o vigário disse ? Uma igreja pequena, numa praça, perto duma ladeira…

ZÉ - (Corre os olhos em volta) e a gente pudesse perguntar a alguém…

ROSA - Essa hora está todo o mundo dormindo. (Olha-o quase com raiva).
Todo o mundo… menos eu, que tive a infelicidade de me casar com um pagador de promessas. (Levanta-se e procura convencê-lo). Escute, Zé… já que a igreja está fechada, a gente podia ir procurar um lugar pra dormir. Você já pensou que beleza agora uma cama ?…

ZÉ - E a cruz ?

ROSA - Você deixava a cruz aí e amanhã, de dia…

ZÉ - Podem roubar…

ROSA - Quem é que vai roubar uma cruz, homem de Deus ? Pra que serve uma cruz ?

ZÉ - Tem tanta maldade no mundo. Era correr um risco muito grande, depois de ter quase cumprido a promessa. E você já pensou ; se me roubassem a cruz, eu ia ter que fazer outra e vir de novo com ela nas costas da roça até aqui. Sete léguas [14].

ROSA - Pra quê ? Você explicava à santa que tinha sido roubado, ela não ia fazer questão.

ZÉ - É o que você pensa. Quando você vai pagar uma conta no armarinho [15] e perde o dinheiro no caminho, o turco perdoa a dívida ? Uma ova !

ROSA - Mas você já pagou a sua promessa, já trouxe uma cruz de madeira da roça até à igreja de Santa Bárbara. Está aí a igreja de Santa Bárbara, está aí a cruz. Pronto. Agora, vamos embora.

ZÉ - Mas aqui não é a igreja de Santa Bárbara. A igreja é da porta pra dentro.

ROSA - Oxente ! [16] Mas a porta está fechada e a culpa não é sua. Santa Bárbara deve saber disso, que diabo.

ZÉ - (Pensativo) Só se eu falasse com ela e explicasse a situação…

ROSA - Pois então… fale !

ZÉ - (Ergue os olhos para o céu, medrosamente e chega a entreabrir os
lábios, como se fosse dirigir-se à santa. Mas perde a coragem
) Não,
não posso…

ROSA - Por que, homem ?! Santa Bárbara é tão sua amiga… Você não está em dia com ela ?

ZÉ - Estou, mas esse negócio de falar com santo é muito complicado. Santo nunca responde em língua da gente… não se pode saber o que ele pensa. E além do mais, isso também não é direito. Eu prometi levar a cruz até dentro da igreja, tenho que levar. Andei sete léguas. Não vou me sujar com a santa por causa de meio metro.

ROSA - E pra você não se sujar com a santa, eu vou ter que dormir no chão, no “hotel do padre”.
(Olha-o com raiva e vai deitar-se num dos degraus da escada da igreja).
E se tudo isso ainda fosse por alguma coisa que valesse a pena…

ZÉ - Você podia não ter vindo. Quando eu fiz a promessa, não falei em você, só na cruz.

ROSA - Agora você diz isso. Dissesse antes…

ZÉ - Não me lembrei. Você também não reclamou…

ROSA - Sou sua mulher. Tenho que ir pra onde você for…

ZÉ - Então…

Bonitão e Marli : descrição nas didascálias

Rosa ajeita-se da melhor maneira possível no degrau, enquanto Zé-do-Burro, não menos cansado do que ela faz um esforço sobre-humano para não adormecer. Cochila [17], montando guarda à sua cruz. Subitamente, irrompem na praça Marli e Bonitão. Ela tem, na realidade, vinte e oito anos, mas aparenta mais dez. Pinta-se com algum exagero, mas mesmo assim não consegue esconder a tez amarelo-esverdeada. Possui alguns traços de uma beleza doentia, uma beleza triste e suicida. Usa um vestido muito curto e decotado, já um tanto gasto e fora de moda, mas ainda de bom efeito visual. Seus gestos e atitudes refletem o conflito da mulher que quer libertar-se de uma tirania que, no entanto, é necessária ao seu equilíbrio psíquico - a exploração de que é vítima por parte de Bonitão vem, em parte, satisfazer um instinto maternal frustrado. Há em seu amor e em seu aviltamento [18], em sua degradação voluntária, muito de sacrifício maternal, ao qual não falta, inclusive, um certo orgulho. Bonitão é insensível a tudo isso. Ele é frio e brutal em sua “profissão”. Encara a exploração a que submete Marli e outras mulheres, como um direito que lhe assiste, ou melhor, um dom que a natureza lhe concedeu, juntamente com seus atributos físicos. Em seu entender, sua beleza máscula e seu vigor sexual, aliados a um direito natural de subsistir, justificam plenamente seu modo de vida. É de estatura um pouco acima da média, forte e de pele trigueira [19], amulatada. A ascendência negra é visível, embora os cabelos sejam lisos, reluzentes de gomalina e os traços regulares, com exceção dos lábios grossos e sensuais e das narinas um tanto dilatadas. Veste-se sempre de branco, colarinho alto, sapatos de duas cores. Descem a ladeira, ela na frente, a passos rápidos. Ele a segue, como se viessem já de uma discussão.

O Pagador de promessas - 3 - Bonitão e Marli…

Bonitão e Marli…

O Pagador de promessas - 3 - Bonitão e Marli…

BONITÃO – Espere. Não adianta andar depressa…
MARLI – É melhor discutirmos isso em casa.
BONITÃO – (Alcança-a e obriga a parar torcendo-lhe violentamente o braço) Não, vamos resolver aqui mesmo. Não tenho nada que discutir com você…
MARLI – (Livra-se dele com um safanão, mas seu rosto se contrai dolorosamente) Estúpido !
BONITÃO – Ande, vamos deixar de mas-mas. Passe pra cá o dinheiro.
MARLI – (Tira do bolso do vestido um maço de notas e entrega a ele) Não podia esperar até chegar em casa ?
BONITÃO – (Chega mais para perto do jato de luz e conta as notas, rapidamente) Só deu isto ?
MARLI – Só. A noite hoje não foi boa. Você viu, o “castelo” estava vazio.
BONITÃO – E aquele galego que estava conversando com você quando cheguei ?
MARLI – Uma boa conversa. Queria se fretar comigo. Ficou mangando a noite toda e não se resolveu…
BONITÃO – (Mete subitamente a mão no decote de Marli e tira de entre os seios uma nota) Sua vaca ! Ele faz menção de dar-lhe um bofetão, ela corre e refugia-se atrás da cruz. Zé-do-Burro desperta de sua semi-sonolência.
MARLI – Eu precisava desse dinheiro. Pra pagar o quarto, você sabe.
BONITÃO – Não gosto de ser tapeado. Por que não pediu ?
MARLI – E você dava ?
BONITÃO – Claro que não. (Guarda o dinheiro na carteira) Isso ia fazer falta no meu orçamento. Tenho compromissos e você bem sabe que não gosto de pedir dinheiro emprestado. É uma questão de feitio.
MARLI – E eu, que faço pra pagar o quarto ? Já devo dois meses e a dona anda me olhando atravessado.
BONITÃO – (Indiferente) É um problema seu. Tenho muita coisa em que pensar.
MARLI – Eu sei, eu sei no que você pensa…
BONITÃO – (Sorri e há em seu sorriso uma sombra de ameaça) Penso, por exemplo, que você, de três meses pra cá, está fazendo muito pouco. A Matilde está fazendo quase o dobro…
MARLI – (Compreende a ameaça, avança para ele sacudida pelo ciúme e pelo pavor de perdê-lo) Eu sei, você está dando em cima daquela arreganhada. Ela mesma anda dizendo.
BONITÃO – Eu não dou em cima de mulher nenhuma, você sabe disso. É uma questão de princípios.
MARLI – Quer dizer que é ela quem está dando em cima de você !
BONITÃO – Ela perguntou se eu estava precisando de dinheiro.
MARLI – (Ansiosamente) E você ?…
BONITÃO – Eu só pedi umas informações de ordem técnica, arrecadação diária etc…
MARLI – (Agarra-o freneticamente pelos braços) Bonitão, você não aceitou o dinheiro dela, aceitou ?! Você não aceitou o dinheiro daquela vagabunda !
BONITÃO – (Olha-a friamente) E que tinha, se aceitasse ? Eu também preciso viver.
MARLI – Mas o que eu lhe dou não chega ?!
BONITÃO – Você compreende, eu também tenho ambições. Se eu não tivesse qualidades, bem. Mas eu sei que tenho qualidades. É justo que viva de acordo com essas qualidades.
MARLI – Mas o que lhe falta ? Eu não tenho lhe dado tudo que você me pede ? Se for preciso, dou mais ainda. Não pense que é por medo de que você me largue pela Matilde, não. (Alisa sua roupa e admira-o, maternalmente) É porque tenho prazer em ver você vestido com a roupa que eu dei, com os sapatos que eu comprei e com a carteira recheada de notas que eu ganhei pra você. Tenho orgulho, sabe ?
BONITÃO – (Desvencilha-se dela) Pois então veja se na próxima vez não esconde dinheiro no decote. Tenho certeza de que a Matilde não é capaz de um gesto feio desses.
MARLI – Ela é capaz de coisas muito piores. Se você quiser, eu lhe conto.
BONITÃO – (Bruscamente) Não quero ouvir nada. Quero é que você vá pra casa.
MARLI – (Decepcionada) Você não vai comigo ?
BONITÃO – Não, vou ficar um pouco mais por aqui. Vá na frente que daqui a pouco eu apareço por lá.
MARLI – (Enciumada) E o que é que você vai ficar fazendo na rua a uma hora dessas ?
BONITÃO – (Com muita seriedade) Ora, mulher, eu preciso trabalhar ! (Acende um cigarro, abstraindo-se da presença de Marli, que o fita como um cão escorraçado pelo dono. Só então este se mostra intrigado com a cruz no meio da praça. Examina-a curiosamente e por fim dirige-se a Zé-do-Burro) É sua ?
(ZÉ – balança a cabeça em sinal afirmativo. Marli vai até à escada da igreja, senta-se num degrau, sem se incomodar com Rosa, deitada mais acima, tira os sapatos e movimenta os dedos doloridos. )
BONITÃO – (Nota a igreja, faz uma associação de idéias) Encomenda ?
ZÉ – Não, promessa.
BONITÃO – (A princípio parece não entender, depois ri). Gozado.
ZÉ – Não acho.
BONITÃO – Não falei por mal. Eu também sou meio devoto. Até uma vez fiz promessa pra Santo Antônio…
ZÉ – Casamento ?
BONITÃO – Não, ela era casada.
ZÉ – E conseguiu a graça ?
BONITÃO – Consegui. O marido passou uma semana viajando…
ZÉ – E o senhor pagou a promessa ?
BONITÃO – Não, pra não comprometer o santo.
ZÉ – Nunca se deve deixar de pagar uma promessa. Mesmo quando é dessas de comprometer o santo. Garanto que da próxima vez Santo Antônio vai se fingir de surdo. E tem razão.
BONITÃO – O senhor compreende, Santo Antônio ia ficar mal se soubessem que foi ele quem fez o trouxa viajar. (Nota que Marli ainda não se foi) Que é que você ainda está fazendo aí ?
MARLI – Esperando você.
BONITÃO – (Vai a ela) Já lhe disse que vou depois. Vai ficar agora grudada em mim ?
MARLI – (Levanta-se) Escute, Bonitão… você não podia deixar eu ficar ao menos com aquela nota ?
BONITÃO – Já lhe disse que não. Não insista.
MARLI – Mas eu preciso pagar o quarto !
BONITÃO – O quarto é seu, não é meu.
MARLI – Mas o dinheiro é meu. É justo que eu fique ao menos com algum.
BONITÃO – É justo por quê ?
MARLI – Porque fui eu que trabalhei.
BONITÃO – E desde quando trabalhar dá direito a alguma coisa ? Quem lhe meteu na cabeça essas idéias ? (Olha-a de cima a baixo, com desconfiança) Está virando comunista ?

Marli fita-o com ódio e sai bruscamente pela direita. Bonitão acompanha-a com o olhar e depois sorri, tira o dinheiro do bolso e torna a contá-lo.

Zé, Bonitão, Rosa…

Zé, Bonitão, Rosa…

Dias Gomes – O Pagador de promessas - 4 - Zé, Bonitão, Rosa…

ZÉ – (Candidamente) Esse dinheiro… é dela mesmo ?
BONITÃO (Guarda o dinheiro) Bem, esta é uma maneira de olhar as coisas. E toda coisa tem pelo menos duas maneiras de ser olhada. Uma de lá pra cá, outra de cá pra lá. Entendeu ?
ZÉ – Não…
BONITÃO – Não vale a pena explicar. É uma questão de sensibilidade.
ZÉ – O senhor é… marido dela ?
BONITÃO – Não, sou assim uma espécie de fiscal do imposto de renda. (Sobe, como se fosse sair, mas se detém diante de Rosa, cujo vestido, levantado, deixa ver um palmo de coxa).
ROSA – (Abre os olhos, sentindo que está sendo observada) Que é ?
BONITÃO – Nada… estava só olhando… (Rosa conserta o vestido.)
BONITÃO – Não deve ser lá muito confortável essa cama… (Rosa olha-o com raiva.) BONITÃO – (Olha-a mais detidamente) E olhe que você bem merece coisa melhor. ROSA – Diga isso a ele (Aponta Zé-do-Burro).
BONITÃO – A ele ?
ROSA – Meu marido.
BONITÃO – Ah, você também veio pagar promessa…
ROSA – Eu não, ele. E por causa dele estou dormindo aqui, no batente de uma igreja, como qualquer mendiga. (Senta-se)
ZÉ – Não deve faltar muito para abrir a igreja. O senhor sabe que horas são ?
BONITÃO – (Consulta o relógio) Um quarto para as cinco.
ZÉ – Sabe a que horas abre a igreja ?
BONITÃO – Não, não é bem o meu ramo…
ZÉ – Mas às seis horas deve ter missa. Hoje é o dia de Santa Bárbara…
ROSA – (Ressentida) Às seis horas. Tenho que agüentar mais de uma hora ainda neste batente duro. E a promessa não é minha !
BONITÃO – É capaz da porta da sacristia já estar aberta.
ZÉ – O senhor acha ?
BONITÃO – Padre acorda cedo…
ZÉ – Às cinco horas ?
BONITÃO – Então ; tem que se preparar para a missa das seis.
ZÉ – É verdade…
BONITÃO – Por que o senhor não vai ver ?
ZÉ – É… (Hesita um pouco)
BONITÃO – A porta é do lado de lá…
ZÉ – Rosa, você vigia a cruz, eu vou dar a volta… não demoro. (Sai)
BONITÃO – Pode ir sem susto que eu ajudo a tomar conta de sua cruz. (Depois que Zé-do-Burro sai) das duas.
ROSA – Só que uma ele carrega nas costas e a outra… se quiser que vá atrás dele. (Levanta-se)
BONITÃO – E você não é mulher para andar atrás de qualquer homem… ao contrário, é uma cruz que qualquer um carrega com prazer…
ROSA – (Com recato, mas no fundo envaidecida) Ora, me deixe.
BONITÃO – Palavra. Seu marido não lhe faz justiça. Isso não é trato que se dê a uma mulher… mesmo sendo mulher da gente.
ROSA – Se ele faz pouco de mim, faz pouco do que é dele.
BONITÃO – Não discuto. Só acho que você não é mulher para dormir em batente de igreja. Tem qualidades para exigir mais : boa cama, com colchão e melhor companhia.
ROSA – Não fale em cama pra quem tem o corpo moído, como eu.
BONITÃO – Tão cansada assim ?
ROSA – Duas noites sem dormir, sete léguas no calcanho…
BONITÃO – Sete léguas ? Quantos quilômetros ?
ROSA – Sei lá… só sei que sete vezes amaldiçoei aquele dia em que fui roubar caju com ele na roça dos padres…
BONITÃO – Ah, foi assim…
ROSA – A gente faz cada besteira…
BONITÃO – Quanto tempo faz ?
ROSA – Oito anos…
BONITÃO – E você casou com ele ?
ROSA – Casei.
BONITÃO – Sem gostar ?
ROSA – (Depois de um tempo) Gostava, sim. Sabe, na roça, o homem é feio, magro, sujo e mal vestido. Ele até que era dos melhores. Tinha um sítio [20]
BONITÃO – E daí ?
ROSA – Daí, eu achei que ele garantia tudo que eu queria da vida : homem e casa. A gente quando é franga, com licença da palavra, tem merda na cabeça.
BONITÃO – (Algo interessado) Ele tem um sítio, é ?
ROSA – Tinha, agora tem só um pedaço. Dividiu o resto com os lavradores pobres.
BONITÃO – Por quê ?
ROSA – Fazia parte da promessa.
BONITÃO – Que é que está esperando ? Virar santo ?
ROSA – Não brinque. Pelo caminho tinha uma porção de gente querendo que ele fizesse milagre. E não duvide. Ele é capaz de acabar fazendo. Se não fosse a hora, garanto que tinha uma romaria aqui, atrás dele.
BONITÃO – Depois de cumprir a promessa, ele vai voltar pra roça ?
ROSA – Vai.
BONITÃO – E você ?
ROSA – Também. Por quê ?
BONITÃO – Se você viesse pra cidade, eu podia lhe garantir um bonito futuro…
ROSA – Fazendo o quê ?
BONITÃO – Isso depois se via.
ROSA – Eu não sei fazer nada.
BONITÃO – (Segura-a por um braço) Mulheres como você não precisam saber coisa alguma, a não ser o que a natureza ensinou… (Rosa puxa o braço bruscamente, depois de manter, por alguns segundos, um olhar de desafio.)
ROSA – Não faça isso ! Ele pode voltar de repente
BONITÃO – Ele deve ter ido acordar o padre. (Volta a aproximar-se dela)
ROSA – (Desvencilha-se dele novamente) Me solte. (Volta a sentar-se na escada) Eu queria era dormir. Dava a vida por uma cama… com um lençol branco… e uma bacia d’água quente onde meter os pés.
BONITÃO – Eu posso lhe arranjar um hotelzinho aqui perto… (Rosa lança-lhe um olhar hostil.)
BONITÃO – Isso sem segundas intenções… só pra você dormir, descansar dessa romaria.
ROSA – Não quero me meter em encrencas.
BONITÃO – Não há nenhum perigo de encrenca. Sou muito cotado com o porteiro do hotel e tenho boas relações com a polícia. Nesta zona, todos respeitam o Bonitão.
ROSA – (Quase sensualmente) Bonitão.
BONITÃO – (Vaidoso) É um apelido…

Dias Gomes – O Pagador de promessas - 5

(Rosa olha-o de cima a baixo. Bonitão senta-se junto dela.)

ROSA – Não chegue perto, estou muito suada.
BONITÃO – No hotel tem banheiro… para quem andou sete léguas, um banho de chuveiro e depois uma cama com colchão de mola…
ROSA – Colchão de mola mesmo ?
BONITÃO – Então…
ROSA – Nunca dormi num colchão de mola. Deve ser bom.
BONITÃO – Uma delícia… (Entra Zé-do-Burro pela direita. Bonitão levanta-se.)
ZÉ – Tudo fechado. Tem jeito não.
ROSA (Revoltada) – E eu que agüente este batente duro até Deus sabe lá que horas.
ZÉ – Paciência, Rosa. Seu sacrifício fica valendo.
ROSA – Pra quem ? Pra Santa Bárbara ? Eu não fiz promessa nenhuma.
ZÉ– Oxente ! Melhor ainda. Amanhã, quando você fizer, a santa já está lhe devendo !
ROSA – Nunca vi santo pagar dívida. (Volta a deitar-se no degrau)
BONITÃO – (Assumindo um ar tão eclesiástico quanto possível) A senhora faz mal em ser tão descrente. Quem sabe se Santa Bárbara já não está providenciando o pagamento dessa dívida ? E quem sabe se não escolheu a mim pra pagador ?
ZÉ – (Muito ingenuamente) O senhor não era fiscal do imposto de renda ? Agora é pagador de Santa Bárbara…
BONITÃO – Meu caro, com o custo de vida aumentando dia a dia, a gente tem que se virar. Mas não é esse o caso. Digo que Santa Bárbara já deve estar tratando de liquidar o débito hoje contraído com sua senhora, porque me fez passar por aqui esta noite.
ZÉ – Não vejo nada de mais nisso.
BONITÃO – Porque o senhor não sabe que eu posso, em cinco minutos, arranjar uma boa cama, com colchão de mola, num hotel perto daqui.
ZÉ – Pra ela ?
BONITÃO – E pro senhor também.
ZÉ – Eu não posso. Tenho que esperar abrir a igreja. Se soubesse que não iam roubar a cruz…
BONITÃO – (Rapidamente) Oh, não, a cruz não deve ficar sozinha. Esta zona está cheia de ladrões. A cruz é de madeira e a madeira está caríssima.
ZÉ – É o que eu acho. Não devo sair daqui.
BONITÃO – Mas eu posso ficar tomando conta, enquanto o senhor e sua senhora vão descansar.
ZÉ – O senhor ?
BONITÃO – E por que não ?
ZÉ – Mas a igreja pode demorar a abrir. Pelo menos uma hora ainda.
BONITÃO – Eu espero. Sua esposa me contou a caminhada que fizeram, o senhor carregando nas costas essa cruz através de léguas e léguas, para cumprir uma promessa. Isso me comoveu.
ZÉ – Mas não é justo. Não foi o senhor quem fez a promessa.
ROSA – Ele está querendo ajudar, Zé.
ZÉ – Mas não é direito. Eu prometi cumprir a promessa sozinho, sem ajuda de ninguém. E essa história de dormir no hotel não está no trato.
BONITÃO – E sua senhora está no trato ?
ZÉ – Rosa ? Não, ela pode ir.
BONITÃO – Nesse caso, se quiser que eu leve sua senhora… ao menos ela descansa enquanto espera pelo senhor.
ZÉ – Você quer, Rosa ? Quer ir esperar por mim no hotel ? (Volta-se para Bonitão) É hotel decente ?
BONITÃO – (Fingindo-se ofendido) Ora, o senhor acha que ia indicar…
ZÉ – Desculpe, é que sempre ouvi dizer que aqui na cidade…
BONITÃO – Pode confiar em mim.
ZÉ – É longe daqui ?
BONITÃO – Não, basta subir aquela ladeira…
ZÉ – Que é que você diz, Rosa ?
ROSA – (Percebendo o jogo de Bonitão) Quero não, Zé. Prefiro ficar aqui com você.
ZÉ – Ainda agora mesmo você estava se queixando.
BONITÃO – Não é pra menos. Deve estar exausta. Sete léguas.
ZÉ – Afinal de contas, você tem razão, a promessa é minha, não é sua. Vá com o moço, não tenha acanhamento.
BONITÃO – Eu vou com ela até lá, apresento ao porteiro, que é meu conhecido - sim, porque uma mulher sozinha, o senhor sabe, eles não deixam entrar - depois volto para lhe dizer o número do quarto. Daqui a pouco, depois de cumprir a sua promessa, o senhor vai pra lá.
ZÉ – Se o senhor fizesse isso, era um grande favor. Eu não posso me afastar daqui.
BONITÃO – Nem deve. Primeiro, Santa Bárbara.
ROSA – Zé, é melhor eu ficar com você…
ZÉ – Pra quê, Rosa ? Assim você vai logo descansar numa boa cama, não precisa ficar aí deitada nesse batente frio…
BONITÃO – Um perigo ! Pode pegar uma pneumonia.
ROSA – (Inicia a saída. Pára, hesitante. Pressente o perigo que vai correr. Procura, com o olhar, fazer Zé-do-Burro compreender o seu receio) Zé…
ZÉ – Ahn, sim. (Enfia a mão no bolso, tira um maço de notas) Pode ser que precise pagar adiantado…
ROSA – (Recebe o dinheiro. Encara o marido) Talvez seja melhor, depois de entregar a cruz, você mandar também rezar uma missa em ação de graças…
ZÉ – (Sem entender o alcance da sugestão) É, não é má idéia. (Rosa sobe a ladeira e Bonitão a segue. )
BONITÃO – (Saindo) Volto num minuto.
ZÉ – Está bem.
(Senta-se ao pé da cruz e procura uma maneira de apoiar o corpo sobre ela. Aos poucos, é vencido pelo sono. As luzes se apagam em resistência.)

Fim do primeiro quadro

Segundo Quadro

Segundo Quadro

Segundo Quadro

Segundo Quadro - 1 (Indicações cênicas)

As luzes voltam a acender-se, lentamente, até dia claro. Ouvem-se, distante, ruídos esparsos da cidade que acorda. Um ou outro buzinar, foguetes estouram saudando Iansan, a Santa Bárbara nagô, e o sino da igreja começa a chamar para a missa das seis. Mas nada disso acorda ZÉ-do-Burro. Entra, pela ladeira, a Beata. Toda de preto, véu na cabeça, passinho miúdo, vem apressada, como se temesse chegar atrasada. Passa por ZÉ-do-Burro e a cruz sem notá-los. Pára diante da escada e resmunga. Fica a critério da direção utilizar neste quadro figurantes que descerão a ladeira e entrarão na igreja.

BEATA – Porta fechada. É sempre assim. A gente corre, com medo de chegar atrasada e quando chega aqui a porta está fechada. Por que não abrem primeiro a porta, pra depois tocar o sino ? Não, primeiro tocam o sino, depois abrem a porta. Isso é esse sacristão (Pára de resmungar ao ver a cruz. Ajeita os óculos, como se não acreditasse no que está vendo. Aproxima-se e examina detalhadamente a cruz e o seu dono adormecido. Sua expressão é da maior estranheza) Virgem Santíssima !

Neste momento, abre-se a porta da igreja e surge o Sacristão. É um homem de perto de 50 anos. Sua mentalidade, porém, anda aí pelos quatorze. Usa óculos de grossas lentes, é míope. O cabelo teima em cair-lhe na testa, acentuando a aparência de retardado mental. Ele parece bêbedo de sono. Boceja largamente, ruidosamente, depois de abrir a primeira banda da porta. Espreguiça-se e solta um longo gemido. Depois que abre toda a porta, encosta-se por um momento no portal e cochila, sem dar pela Beata, que se aproxima.

BEATA – (Dá-lhe uma leve cotovelada) Ei, rapaz…
SACRISTÃO – (Desperta muito assustado) Sim, Padre, já vou !…
BEATA – Que padre coisa nenhuma…
SACRISTÃO – Ah, é a senhora…
BEATA – Vou me queixar ao Padre Olavo dessa mania de bater o sino antes de abrir a porta da igreja. Eu ouço o toque, venho pondo as tripas pela boca, chego aqui, e a porta ainda está fechada.
SACRISTÃO – Também por que a senhora vem logo na missa das seis ? Por que não vem mais tarde ?
BEATA – (Malcriada) Porque quero. Porque não é da sua conta. (Aponta para a cruz) Que é isso ?
SACRISTÃO – Isso o quê ?
BEATA – Está vendo não ? Uma cruz enorme no meio da praça…
SACRISTÃO – (Apura a vista) Ah, sim… agora percebo… é uma cruz de madeira… e parece que há um homem dormindo junto dela…
BEATA – Vista prodigiosa a sua ! Claro que é uma cruz de madeira e que há um homem junto dela. O que eu quero saber é a razão disso.
SACRISTÃO – Não sei… como quer que eu saiba ? Por que a senhora não pergunta a ele ?
BEATA – (Bruscamente) Eu é que não vou perguntar coisa nenhuma !
SACRISTÃO – Talvez ele tenha desgarrado da procissão…
BEATA – Que procissão ? De Santa Bárbara ? A procissão ainda não saiu. E já viu alguém carregar cruz em procissão ? Nem na do Senhor Morto. (Benze-se e entra apressadamente na igreja)
O Sacristão aproxima-se de ZÉ-do-Burro, curioso. E quando entra Bonitão, pela ladeira. Ele vê a igreja aberta, estranha.

BONITÃO – Oxente…
SACRISTÃO – (Olha-o aparvalhado) É uma cruz mesmo…
BONITÃO – E que pensou você que fosse ? Um canhão ? (Aproxima-se de Zé-do-Burro) Sono de pedra… não acordou nem com os foguetes de Santa Bárbara. Dizem que é assim que dormem as pessoas que têm a consciência tranqüila e a alma leve… (Cínico) Eu também sou assim, quando caio na cama é um sono só. (Sacode Zé-do-Burro) Camarado… oh, meu camarado !…
ZÉ – (Desperta) Oh, já é dia…
BONITÃO – Já. E a igreja já está aberta, você pode entregar o carreto.
ZÉ – (Levanta-se, com dificuldade, os músculos adormecidos e doloridos) É verdade…
BONITÃO – Eu voltei aqui pra lhe dizer o número do quarto de sua mulher. É o 27. Um bom quarto, no segundo andar. (Apressadamente) Pelo menos foi o que o porteiro me garantiu.
ZÉ – Ah, obrigado…
BONITÃO – O hotel é aquele ali, o primeiro, logo depois de subir a ladeira e dobrar à direita. Hotel Ideal Eu demorei um pouco porque fiquei jogando damas com o porteiro.
SACRISTÃO – (Vivamente interessado) Ganhou ?
BONITÃO – Empatamos.
SACRISTÃO – Ah, eu também sou louco por damas !
BONITÃO – (Examina-o de cima a baixo) Francamente, ninguém diz…
(Padre Olavo surge na porta da igreja.)
SACRISTÃO – (Como se tivesse sido surpreendido em falta) Padre Olavo !…
ZÉ – Preciso falar com ele…
Sacristão dirige-se apressadamente à igreja. Pára na porta, ante o olhar intimidador de Padre Olavo. É um padre moço ainda. Deve contar, no máximo, quarenta anos. Sua convicção religiosa aproxima-se do fanatismo. Talvez, no fundo, isto seja uma prova de falta de convicção e autodefesa. Sua intolerância - que o leva, por vezes, a chocar-se contra princípios de sua própria religião e a confundir com inimigos aqueles que estão ao seu lado – não passa, talvez, de uma couraça com que se mune contra uma fraqueza consciente.
PADRE – (Para o Sacristão) Que está fazendo aí ?
SACRISTÃO – (À guisa de defesa) Estava conversando com aqueles homens.
PADRE – E eu lá dentro à sua espera para ajudar à missa. (Repara em Bonitão e Zé-do-Burro) Quem são ?
SACRISTÃO – Não sei. Um deles quer falar com o senhor.
ZÉ – (Adianta-se) Sou eu, Padre. (Inclina-se, respeitoso e beija-lhe a mão)
PADRE – Agora está na hora da missa. Mais tarde, se quiser…
ZÉ – É que eu vim de muito longe, Padre. Andei sete léguas…
PADRE – Sete léguas ? Para falar comigo.
ZÉ – Não, pra trazer esta cruz.
PADRE – (Olha a cruz, detidamente) E como a trouxe… num caminhão ?
ZÉ – Não, Padre, nas costas.
SACRISTÃO – (Expandindo infantilmente a sua admiração) Menino !
PADRE – (Lança-lhe um olhar enérgico) Psiu ! Cale a boca ! (Seu interesse por Zé-do-Burro cresce) Sete léguas com essa cruz nas costas. Deixe ver seu ombro. (Zé -do-Burro despe um lado do paletó, abre a camisa e mostra o ombro. Sacristão espicha-se todo para ver e não esconde a sua impressão.)
SACRISTÃO – Está em carne viva !
PADRE – (Parece satisfeito com o exame) Promessa ?
ZÉ – (Balança afirmativamente a cabeça) Pra Santa Bárbara. Estava esperando abrir a igreja…
SACRISTÃO – Deve ter recebido dela uma graça muito grande ! Padre faz um gesto nervoso para que o Sacristão se cale.
ZÉ – Graças a Santa Bárbara, a morte não levou o meu melhor amigo.
PADRE – (Padre parece meditar profundamente sobre a questão) Mesmo assim, não lhe parece um tanto exagerada a promessa ? E um tanto pretensiosa também ?
ZÉ – Nada disso, seu Padre. Promessa é promessa. É como um negócio. Se a gente oferece um preço, recebe a mercadoria, tem que pagar. Eu sei que tem muito caloteiro por aí. Mas comigo, não. É toma lá, dá cá. Quando Nicolau adoeceu, o senhor não calcula como eu fiquei.
PADRE – Foi por causa desse… Nicolau, que você fez a promessa ?
ZÉ – Foi. Nicolau foi ferido, seu Padre, por uma árvore que caiu, num dia de tempestade.
SACRISTÃO – Santa Bárbara ! A árvore caiu em cima dele ?!
ZÉ – Só um galho, que bateu de raspão na cabeça. Ele chegou em casa, escorrendo sangue de meter medo ! Eu e minha mulher tratamos dele, mas o sangue não havia meio de estancar.
PADRE – Uma hemorragia.
ZÉ – Só estancou quando eu fui no curral, peguei um bocado de bosta de vaca e taquei em cima do ferimento.
PADRE – (Enojado) Mas meu filho, isso é atraso ! Uma porcaria !
ZÉ – Foi o que o doutor disse quando chegou. Mandou que tirasse aquela porcaria de cima da ferida, que senão Nicolau ia morrer.
PADRE – Sem dúvida.
ZÉ – Eu tirei. Ele limpou bem a ferida e o sangue voltou que parecia uma cachoeira. E que de que o doutor fazia o sangue parar ? Ensopava algodão e mais algodão e nada. Era uma sangueira que não acaba mais. Lá pelas tantas, o homenzinho virou pra mim e gritou : corre, homem de Deus, vai buscar mais bosta de vaca, senão ele morre !
PADRE – E… o sangue estancou ?
ZÉ – Na hora. Pois é um santo remédio. Seu vigário sabia ? Não sendo de vaca, de cavalo castrado também serve. Mas há quem prefira teia de aranha.
PADRE – Adiante, adiante. Não estou interessado nessa medicina.
ZÉ – Bem, o sangue estancou. Mas Nicolau começou a tremer de febre e no dia seguinte aconteceu uma coisa que nunca tinha acontecido : eu saí de casa e Nicolau ficou. Não pôde se levantar. Foi a primeira vez que isso aconteceu, em seis anos : eu saí, fui fazer compras na cidade, entrei no Bar do Jacob pra tomar uma cachacinha, passei na farmácia de “seu” Zequinha pra saber das novidades - tudo isso sem Nicolau. Todo mundo reparou, porque quem quisesse saber onde eu estava, era só procurar Nicolau. Se eu ia na missa, ele ficava esperando na porta da igreja…
PADRE – Na porta ? Por que ele não entrava ? Não é católico ?
ZÉ – Tendo uma alma tão boa, Nicolau não pode deixar de ser católico. Mas não é por isso que ele não entra na igreja. É porque o vigário não deixa. (Com grande tristeza) Nicolau teve o azar de nascer burro… de quatro patas.
PADRE – Burro ?! Então esse… que você chama de Nicolau, é um burro ?! Um animal ?! [21]
ZÉ – Meu burro… sim senhor.
PADRE – E foi por ele, por um burro, que fez essa promessa ?
ZÉ – Foi… é bem verdade que eu não sabia que era tão difícil achar uma igreja de Santa Bárbara, que ia precisar andar sete léguas pra encontrar uma, aqui na Bahia…
BONITÃO – (Que assistiu a toda a cena, um pouco afastado, solta uma gargalhada grosseira) Ele se estrepou.
(Padre Olavo olha-o, surpreso, como se só agora tivesse notada a sua presença. Bonitão pára de rir quase de súbito, desarmado pelo olhar enérgico do padre.)
ZÉ – Mas mesmo que soubesse, eu não deixava de fazer a promessa. Porque quando vi que nem as rezas do preto Zeferino davam jeito…
PADRE – Rezas ?! Que rezas ?! [22]
ZÉ – Seu vigário me disculpe… mas eu tentei tudo. Preto Zeferino é rezador afamado na minha zona : Sarna de cachorro, bicheira de animal, peste de gado, tudo isso ele cura com duas rezas e três rabiscos no chão. Todo o mundo diz… e eu mesmo, uma vez, estava com uma dor de cabeça danada, que não havia meio de passar… Chamei preto Zeferino, ele disse que eu estava com o Sol dentro da cabeça. Botou uma toalha na minha testa, derramou uma garrafa d’água, rezou uma oração, o sol saiu e eu fiquei bom.
PADRE – Você fez mal, meu filho. Essas rezas são orações do demo.
ZÉ – Do demo, não senhor.
PADRE – Do demo, sim. Você não soube distinguir o bem do mal. Todo homem é assim. Vive atrás do milagre em vez de viver atrás de Deus. E não sabe se caminha para o céu ou para o inferno.
ZÉ – Para o inferno ? Como pode ser, Padre, se a oração fala em Deus ? (Recita) “Deus fez o Sol. Deus fez a luz, Deus fez toda a claridade do Universo grandioso. Com sua Graça eu te benzo, te curo. Vai-te Sol, da cabeça desta criatura para as ondas do Mar Sagrado, com os santos poderes do Padre do Filho e do Espírito Santo”. Depois rezou um Padre Nosso e a dor de cabeça sumiu no mesmo instante.
SACRISTÃO – Incrível !
PADRE – Meu filho, esse homem era um feiticeiro.
ZÉ – Como feiticeiro, se a reza é pra curar ?
PADRE – Não é pra curar, é para tentar. E você caiu em tentação.
ZÉ – Bem, eu só sei que fiquei bom. [23] (Noutro tom) Mas com o Nicolau não houve reza que fizesse ele levantar. Preto Zeferino botou o pé na cabeça do coitado, disse uma porção de orações e nada. Eu já estava começando a perder a esperança. Nicolau de orelhas murchas, magro de se contar as costelas. Não comia, não bebia, nem mexia mais com o rabo para espantar as moscas. Eu vi que nunca mais ia ouvir os passos dele me seguindo por toda a parte, como um cão. Até me puseram um apelido por causa disso : Zé-do-Burro. Eu não me importo. Não acho que seja ofensa. Nicolau não é um burro como os outros. É um burro com alma de gente. E faz isso por amizade, por dedicação. Eu nunca monto nele, prefiro andar a pé ou a cavalo. Mas de um modo ou de outro, ele vem atrás. Se eu entrar numa casa e me demorar duas horas, duas horas ele espera por mim, plantado na porta. Um burro desses, seu padre, não vale uma promessa ?
PADRE – (Secamente, contendo ainda a sua indignação) Adiante.
ZÉ – Foi então que comadre Miúda me lembrou : por que eu não ia no candomblé de Maria de Iansan ?
PADRE – Candomblé ?!
ZÉ – Sim, é um candomblé que tem duas léguas adiante da minha roça. (Com a consciência de quem cometeu uma falta, mas não muito grave) Eu sei que seu vigário vai ralhar comigo. Eu também nunca fui muito de freqüentar terreiro de candomblé. Mas o pobre Nicolau estava morrendo. Não custava tentar. Se não fizesse bem, mal não fazia. E eu fui. Contei pra Mãe-de-Santo o meu caso. Ela disse que era mesmo com Iansan, dona dos raios e das trovoadas. Iansan tinha ferido Nicolau… pra ela eu devia fazer uma obrigação, quer dizer : uma promessa. Mas tinha que ser uma promessa bem grande, porque Iansan, que tinha ferido Nicolau com um raio, não ia voltar atrás por qualquer bobagem. E eu me lembrei então que Iansan é Santa Bárbara e prometi que se Nicolau ficasse bom eu carregava uma cruz de madeira de minha roça até a Igreja dela, no dia de sua festa, uma cruz tão pesada como a de Cristo.
PADRE – (Como se anotasse as palavras) Tão pesada como a de Cristo. O senhor prometeu isso a…
ZÉ – A Santa Bárbara.
PADRE – A Iansan !
ZÉ – É a mesma coisa…
PADRE – (Grita) Não é a mesma coisa ! (Controla-se) Mas continue.
ZÉ – Prometi também dividir minhas terras com os lavradores pobres, mais pobres que eu.
PADRE – Dividir ? Igualmente ?
ZÉ – Sim, padre, igualmente.
SACRISTÃO – E Nicolau… quero dizer, o burro, ficou bom ?
ZÉ – Sarou em dois tempos. Milagre. Milagre mesmo. No outro dia já estava de orelha em pé, relinchando. E uma semana depois todo o mundo me apontava na rua : - “Lá vai Zé-do-Burro com o burro de novo atrás !” (Ri [24]) E eu nem dava confiança. E Nicolau muito menos. Só eu e ele sabíamos do milagre. (Como que retificando) Eu, ele e Santa Bárbara.
PADRE – (Procurando inicialmente controlar-se) Em primeiro lugar, mesmo admitindo a intervenção de Santa Bárbara, não se trataria de um milagre, mas apenas de uma graça. O burro podia ter-se curado sem intervenção divina.
ZÉ – Como, Padre, se ele sarou de um dia pro outro…
PADRE – (Como se não o ouvisse) E além disso, Santa Bárbara, se tivesse de lhe conceder uma graça, não iria fazê-lo num terreiro de candomblé !
ZÉ – É que na capela do meu povoado não tem uma imagem de Santa Bárbara. Mas no candomblé tem uma imagem de Iansan, que é Santa Bárbara…
PADRE – (Explodindo) Não é Santa Bárbara ! Santa Bárbara é uma santa católica ! O senhor foi a um ritual fetichista. Invocou uma falsa divindade e foi a ela que prometeu esse sacrifício !
ZÉ – Não, Padre, foi a Santa Bárbara ! Foi até a igreja de Santa Bárbara que prometi vir com a minha cruz ! E é diante do altar de Santa Bárbara que vou cair de joelhos daqui a pouco, pra agradecer o que ela fez por mim !
PADRE – (Dá alguns passos de um lado para outro, de mão no queixo e por fim detém-se diante de Zé-do-Burro, em atitude inquisitorial [25]) Muito bem. E que pretende fazer depois… depois de cumprir a sua promessa ?
ZÉ – (Não entendeu a pergunta) Que pretendo ? Voltar pra minha roça, em paz com a minha consciência e quite com a santa.
PADRE – Só isso ?
ZÉ – Só…
PADRE – Tem certeza ? Não vai pretender ser olhado como um novo Cristo ?
ZÉ – Eu ?!
PADRE – Sim, você que acaba de repetir a Via Crucis, sofrendo o martírio de Jesus. Você que, presunçosamente, pretende imitar o Filho de Deus…
ZÉ – (Humildemente) Padre… eu não quis imitar Jesus…
PADRE – (Corta terrível) Mentira ! Eu gravei suas palavras ! Você mesmo disse que prometeu carregar uma cruz tão pesada quanto a de Cristo.
ZÉ – Sim, mas isso…
PADRE – Isso prova que você está sendo submetido a uma tentação ainda maior.
ZÉ – Qual, Padre ?
PADRE – A de igualar-se ao Filho de Deus.
ZÉ – Não, Padre.
PADRE – Por que então repete a Divina Paixão ? Para salvar a humanidade ? Não, para salvar um burro !
ZÉ – Padre, Nicolau…
PADRE – É um burro com nome cristão ! Um quadrúpede, um irracional ! (A Beata sai da igreja e fica assistindo à cena, do alto da escada.)
ZÉ – Mas Padre, não foi Deus quem fez também os burros ?
PADRE – Mas não à Sua semelhança. E não foi para salvá-los que mandou seu Filho. Foi por nós, por você, por mim, pela Humanidade !
ZÉ – (Angustiadamente tenta explicar-se) Padre, é preciso explicar que Nicolau não é um burro comum… o senhor não conhece Nicolau, por isso… é um burro com alma de gente…
PADRE – Pois nem que tenha alma de anjo, nesta igreja você não entrará com essa cruz ! (Dá as costas e dirige-se à igreja. O sacristão trata logo de segui-lo).
ZÉ – (Em desespero) Mas Padre… eu prometi levar a cruz até o altar-mor ! Preciso cumprir a minha promessa !
PADRE – Fizesse-a então numa igreja. Ou em qualquer parte, menos num antro de feitiçaria.
ZÉ – Eu já expliquei…
PADRE – Não se pode servir a dois senhores, a Deus e ao diabo !
ZÉ – Padre…
PADRE – Um ritual pagão, que começou num terreiro de candomblé, não pode terminar na nave de uma igreja !
ZÉ – Mas Padre, a igreja…
PADRE – A igreja é a casa de Deus. Candomblé é o culto do diabo !
ZÉ – Padre, eu não andei sete léguas para voltar daqui. O senhor não pode impedir a minha entrada. A igreja não é sua, é de Deus !
PADRE – Vai desrespeitar a minha autoridade ?
ZÉ – Padre, entre o senhor e Santa Bárbara, eu fico com Santa Bárbara.
PADRE – (Para o Sacristão) Feche a porta. Quem quiser assistir à missa que entre pela porta da sacristia. Lá não dá para passar essa cruz.
(Entra na igreja)

A Beata entra também apressadamente atrás do padre. O Sacristão, prontamente, começa a fechar a porta da igreja, enquanto Zé-do-Burro, no meio da praça, nervos tensos, olhos dilatados, numa atitude de incompreensão e revolta, parece disposto a não arredar pé dali. Bonitão, um pouco afastado, observa, tendo nos lábios um sorriso irônico. A porta da igreja se fecha de todo, enquanto um foguetório tremendo saúda Iansan.

CAI O PANO LENTAMENTE.

Segundo Ato

Segundo Ato

Segundo Ato - Primeiro Quadro

Aproximadamente, duas horas depois. Abriu-se a vendola e o Galego aparece trepado num caixote, amarrando um cordão com bandeirolas vermelhas e brancas que vai da porta da venda ao sobrado do lado oposto.
Zé e sua cruz continuam no meio da praça. Ouve-se um pregão : “Beiju… olha o beiju !” Logo após, surge no alto da ladeira uma preta em trajes típicos, com um tabuleiro na cabeça. Ela desce a ladeira e ao passar pelo Galego saúda.

MINHA TIA Iansan lhe dê um bom-dia.

GALEGO (Espanhol) Gracias, Minha Tia.

Minha Tia vai até à igreja e aí, junto dos degraus, pára. A critério da direção e em momentos em que não prejudiquem a ação, transeuntes cruzarão a praça, durante todo o ato.

MINHA TIA - (Para o Galego) Quer vir aqui dar uma mãozinha pra sua tia, meu branco ? Galego apressa-se a ir ajudá-la. Retira primeiro o cavalete que está sobre o tabuleiro, abre-o, depois ajuda-a a tirar o tabuleiro da cabeça e colocá-lo em cima do cavalete.

MINHA TIA - Santa Bárbara lhe pague. (Nota Zé-do-Burro) Oxente ! Que é aquilo ?

GALEGO - Não sei. Já estava acá quando abri a venda. Parece maluco. (Volta a pregar as bandeirolas, enquanto Minha Tia põe -se a arrumar o fogareiro, procura acendê-lo).
Desce a ladeira, passo mole, preguiçoso, Dedé Cospe -Rima. Mulato, cabeleira pixaim, sob o surrado chapéu de coco - um adorno necessário à sua profissão de poeta comerciante. Traz, embaixo do braço, uma enorme pilha de folhetos : abecês, romances populares em versos. E dois cartazes, um no peito, outro nas costas. Num se lê : “ABC da Mulata Esmeralda - uma obra-prima” e no outro “Saiu agora, tá fresco ainda ! O que o cego Jeremias viu na Lua”.

DEDÉ - (declama) Bom dia, Galego amigo ! dia assim eu nunca vi ; para saudar Iansan, não repare eu lhe pedi : me empreste por obséquio dois dedos de parati.

GALEGO - É, com esta história de hacer versos, usted sempre me leva na conversa. (Entra na venda e dá a volta por trás do balcão) É boa mesmo essa do cego Jeremias ? (Serve o parati).

DEDÉ - (Bombástico, teatral) Uma epopéia. Uma nova Ilíada, onde Tróia é a Lua e o cavalo de Tróia é o cavalo de São Jorge ! (Tira um exemplar e coloca sobre o balcão) Em paga do parati.

GALEGO - Si, pêro… yo prefiro la otra, la da mulata Esmeralda.

DEDÉ - Uma prova de bom gosto, Galego ! (Troca os folhetos) É também uma obra-prima. Lembra Castro Alves, modéstia à parte. (Bebe o parati de um trago. Refere-se às bandeirinhas) Bandeirinhas vermelhas e brancas, as cores de Iansan. Depois diz que não crê em candomblé.

GALEGO - Yo no creo, pêro hay quem crea. E yo soy um comerciante…

DEDÉ - Somos dois ! (Estende novamente o cálice) Mais uma dose. Esta eu pago amanhã. (Galego faz cara feia, mas enche de novo o cálice).

A Beata entra da direita e detém-se junto a Minha Tia, ao ver Zé-do-Burro. Mostra-se surpresa e indignada.

BEATA - É o cúmulo ! Ainda está aí !

MINHA TIA - Não vai abrir a igreja hoje, Iaiá ? Dia de Santa Bárbara…

BEATA - (Lança um olhar acusador a Zé-do-Burro). Não enquanto esse indivíduo não for embora.

MINHA TIA - Que foi que ele fez ?

BEATA - Quer entrar com essa cruz na igreja.

MINHA TIA - Só isso ?

BEATA - E você acha pouco ? Acha que Padre Olavo ia permitir ?

MINHA TIA - Oxente ! Por que não ? Foi promessa que ele fez ?

BEATA - Foi. Mas promessa de candomblé. Pra uma tal de Iansan… que Deus me perdoe. (Benze-se). (Dirige-se para a esquerda e ao passar por Zé-do-Burro insulta-o) Herege ! (Sobe a ladeira, seguida do olhar de comovedora incompreensão de Zé-do-Burro).

DEDÉ - (Que ouviu a conversa. Para o Galego) Vou ver se Minha Tia me dá um abará. (Atravessa a praça. Não sem mostrar-se intrigado e curioso ao passar por Zé-do-Burro) Bom dia, Minha Tia !

MINHA TIA - Bom dia, seu Dedé. (Oferece) Acarajé, abará, beiju… Vem benzer !

DEDÉ - (Aponta) Um abará. Pago daqui a pouco, quando entrar o primeiro dinheiro.

MINHA TIA - Eu já sabia… (Entrega o abará embrulhado numa folha de bananeira).

DEDÉ - (Referindo-se a Zé-do-Burro) Que história é essa ?

MINHA TIA - O Senhor ouviu ?

DEDÉ - Ouvi.

MINHA TIA - (Com respeito) Obrigação pra Iansan… (Toca com as pontas dos dedos o chão e a testa).

DEDÉ - Por isso o Padre não deixou ele entrar ?

MINHA TIA - É… coitado.

DEDÉ - Chegou a fechar a porta.

MINHA TIA - O senhor entende ?

DEDÉ - Entendo não.

MINHA TIA - O Padre é um homem tão bom.

DEDÉ - A senhora acha ?

MINHA TIA - Então. Ele é tão amigo dos pobres, faz tanta caridade. Sei não.
(O Guarda entra pela direita. Vai direto a Zé-do-Burro. É um homem que procura safar-se dos problemas que se lhe apresentam. Sua noção do dever coincide exatamente com o seu temor à responsabilidade. Seu maior desejo é que nada aconteça, a fim de que a nada ele tenha que impor a sua autoridade. No fundo, essa autoridade o constrange terrivelmente e mais ainda o dever de exercê-la. )

GUARDA - Olá, amigo.

ZÉ - Olá.

GUARDA - (Refere-se à cruz) É para a procissão de Santa Bárbara ?

ZÉ - Não.

GUARDA - Porque a procissão não sai daqui, sai do Mercado aqui perto e vai até à igreja da Saúde.

ZÉ - Não tenho nada com essa procissão.

GUARDA - E o senhor está aqui fazendo o quê ? Esperando a festa ? Ainda é muito cedo. São oito e meia da manhã. Só na parte da tarde é que isso pega fogo.

ZÉ - Estou aqui desde quatro e meia da manhã.

GUARDA Quatro e meia ?! (Coça a cabeça, preocupado) O senhor deve ser um devoto e tanto ! Mas acontece que escolheu um mau lugar…

ZÉ - A culpa não é minha.

GUARDA - Sim, eu sei, não foi o senhor quem inventou a festa de Santa Bárbara. Mas eu também não tenho culpa de ser guarda. Minha obrigação é facilitar o trânsito, tanto quanto possível.

ZÉ - Sinto muito, mas não posso sair daqui.

GUARDA - (Sua paciência começa a esgotar-se) Ai, ai, ai, ai, ai… eu estou querendo me entender com o senhor…

ZÉ - (Irritando-se também um pouco) Eu também estou querendo me entender com o senhor e com todo o mundo. Mas acho que ninguém me entende.
(Dedé Cospe-Rima, que assistiu a toda a cena, não resiste à curiosidade e vem presenciá-la mais de perto. Minha Tia também acompanha tudo com interesse.)

ZÉ - Aquela mulher me chamou de herege, o Padre fechou a porta da igreja como se eu fosse Satanás em pessoa. Eu, Zé-do-Burro, devoto de Santa Bárbara.

DEDÉ - Mas afinal, o que é que o senhor quer ?

ZÉ - Que me deixem colocar esta cruz dentro da igreja, nada mais. Depois, prometo ir embora. E já estou vexado mesmo por isto !

DEDÉ - Foi promessa. Promessa que ele fez.

GUARDA - (Raciocina, - operação que lhe parece custar tremendo esforço físico) Promessa… colocar a cruz dentro da igreja… Não vejo dificuldade nenhuma nisso. Fala-se com o padre e…

ZÉ - Se o senhor conseguir que ele abra a porta e me deixe entrar, está tudo resolvido.

GUARDA - (Pensa mais um pouco, vê que não há outra maneira de resolver o problema, decide-se) Pois bem, eu vou falar com ele. (Dirige-se para a porta da igreja. Ante os olhares de grande expectativa do Galego, de Dedé, de Minha Tia).

DEDÉ - Não vou lá ajudar também porque eu e esse padre estamos de relações cortadas. (Sai)

GUARDA - (Bate na porta várias vezes, sem resultado, encosta o rosto na porta e chama) Padre ? Abra um instante, por favor ! (Segundos após, abre-se uma fresta e surge por ela a cabeça do Sacristão, receoso.)

GUARDA - Quero falar com o padre.

SACRISTÃO - (Certifica-se de que não há perigo, abre um pouco mais a porta). Entre !

Guarda tira o quepe e entra. Sacristão fecha a porta rapidamente. Rosa desce a ladeira. Vem um pouco apressada, como se temesse não mais encontrá-lo ali. Mas quando vê Zé-do-Burro, diminui o passo, tranqüiliza-se em parte. Não perde, entretanto, um certo ar culposo procura disfarçar.

ROSA - Você ainda está aí ! (Nota a igreja fechada) A igreja não abriu ?

ZÉ - Abriu, sim. Mas o Padre não quer me deixar entrar com a cruz

ROSA - Por quê ?

ZÉ - (Balança a cabeça, na maior infelicidade) Não sei, Rosa não sei. Há duas horas que tento compreender… mas estou tonto tonto como se tivesse levado um coice no meio da testa. Já não entendo nada parece que me viraram pelo avesso e estou vendo as coisas ao contrário do que elas são. O céu no lugar do inferno… o demônio no lugar dos santos.

ROSA - (Refletindo na própria experiência) É isso mesmo. de repente, a gente percebe que é outra pessoa. Que sempre foi outra pessoa é horrível.

ZÉ - Mas não é possível, Rosa. Eu sempre fui um homem de bem Sempre temi a Deus.

ROSA - (Concentrada em seu problema) Zé, isso está parecendo castigo !

ZÉ - Castigo ? Castigo por quê ? Por eu ter feito uma promessa tão grande ? Por ter sido no terreiro de Maria de Iansan ? Mas se santa Bárbara não estivesse de acordo com tudo isso, não tinha feito o milagre.

ROSA - Zé, esqueça Santa Bárbara. Pense um pouco em nós.

ZÉ - Em nós ?

ROSA - Em mim, Zé.

ZÉ - Em você ?

ROSA - Sim Zé, em mim, sua mulher.

ZÉ - Que é que você quer ? Não dormiu, não descansou ?

ROSA - (Sem fitá-lo) Zé, vamos embora daqui.

ZÉ - Agora ?

ROSA - Sim, agora mesmo.

ZÉ - Não posso. Você sabe que eu não posso voltar antes de chegar ao fim da promessa. Não ia ter sossego o resto da vida.

ROSA - Você acredita demais nas coisas.

Zé - É porque você não pensa no que pode acontecer.

ROSA - Mais do que já aconteceu ?

ZÉ - Que aconteceu ? A caminhada, as noites sem dormir, e agora ser xingado como a figura do diabo ? Tudo isso é nada, comparado com o castigo que pode vir.

ROSA - Mas se o Padre não quer deixar você entrar com a cruz, que é que você ainda vai ficar fazendo aqui ?

ZÉ - O Guarda foi falar com ele. Estou esperando. (Como que desculpando-se por não pensar na situação dela) Você, se quiser, pode ir comer qualquer coisa.

ROSA - (Ante a impossibilidade de comunicar a ele o seu problema) Já tomei café no hotel.

ZÉ - Não era bom o hotel que aquele camarada arranjou ?

ROSA - Muito bom. Tinha até pia no quarto e colchão de mola.

ZÉ - Fiquei um pouco preocupado.

ROSA - (Ferida pela falta de ciúmes dele) Comigo ?

ZÉ - Você num hotel, sozinha. Cidade grande, a gente nunca sabe. Se bem que o moço garantiu que era hotel de família.

ROSA - Não tinha então que ter cuidado. O moço era de toda confiança. Tão amável, tão prestativo…

***

REPÓRTER - (Entra acompanhado do Fotógrafo) Lá está ele. (Vai a Zé, enquanto o Fotógrafo circula à procura de ângulos. O Repórter é vivo e perspicaz. Dirige um cumprimento entusiasta a Zé-do-Burro) Bom dia, amigo ! (Aperta efusivamente a mão de Zé-do-Burro) Parabéns ! O senhor é um herói.

ZÉ - (Com estranheza) Herói ?

REPÓRTER - (Com entusiasmo) Sim, sete léguas carregando esta cruz. (Calcula o peso) Pesada, hem ? Sete léguas… quarenta e dois quilômetros. A maior marcha que eu fiz foi de vinte e quatro quilômetros, no Serviço Militar. E o fuzil não pesava tanto assim. (Ri, mas seu riso murcha como um balão, ante o ar de desconfiança de Rosa e Zé-do-Burro) Oh, desculpe… eu sei que o senhor fez uma promessa. A comparação não foi muito feliz… (Para o Fotógrafo) Carijó, pode bater uma chapa. (Posa de frente para Zé-do-Burro, de caderno e lápis em punho) Finja que está falando comigo.

ZÉ - (Começa a impacientar-se) Fingir que estou falando… pra quê ?

REPÓRTER - E dentro de algumas horas o Brasil inteiro vai saber. O senhor vai ficar famoso.

ZÉ - (Contrariado) Mas eu não quero ficar famoso, eu quero…

ROSA - (Interrompe, em tom de repreensão) Que é isso, Zé. Seja mais delicado com o moço. Ele é da gazeta…

REPÓRTER - Mulher dele ?

ROSA - Sou. Também andei sete léguas - meu pé tem cada calo d’água deste tamanho.

REPÓRTER - Maravilhoso. E em quanto tempo cobriram o percurso ?

ROSA - (Não entendeu) Como ?

REPÓRTER - Quero dizer : quando saíram de lá, de sua cidade ?

ROSA - Da roça. Saímos ontem de manhãzinha. Cinco horas da manhã.

REPÓRTER - A que horas chegaram aqui ?

ROSA - Antes das cinco.

REPÓRTER - Fizeram o percurso então em 24 horas. Com uma cruz que deve pesar ?… (Olha interrogativamente para Zé-do-Burro)

ZÉ - (Contrariado) Não sei, não pesei.

REPÓRTER - Por menos que pese, é um “record” ! Sob este aspecto, podemos considerar um grande feito esportivo. Uma prova de resistência física… (para Rosa) e de dedicação… Rosa sorri, envaidecida, sentindo-se heroína também.

REPÓRTER - Mas como nasceu a idéia dessa… peregrinação ? (As perguntas são feitas a Zé-do-Burro, mas este recusa-se a respondê-las).

ROSA - Não nasceu idéia nenhuma. O burro adoeceu, ia morrer - ele fez promessa pra Santa Bárbara.

REPÓRTER - O burro ? Que burro ?

ROSA - O Nicolau.

ZÉ - (Irritado) Por quê ? O senhor também vai achar que o meu burro não vale uma promessa ?

REPÓRTER - Não, de modo algum… eu… eu apenas não sabia… então, tudo isso… quarenta e dois quilômetros… a cruz… tudo por causa de um burro… (Repentinamente, antevendo o interesse que despertará a reportagem) Fabuloso !

ROSA - E não foi só isso. Ele prometeu também repartir o sítio com aquela cambada de preguiçosos.

ZÉ - Que preguiçosos. Gente que quer trabalhar e não tem terra.

REPÓRTER - Repartir o sítio… diga-me, o senhor é a favor da reforma agrária ?

ZÉ - (Não entende) Reforma agrária ? Que é isso ?

REPÓRTER - É o que o senhor acaba de fazer em seu sítio. Redistribuição das terras entre aqueles que não as possuem.

ZÉ - E não estou arrependido, moço. Fiz a felicidade de um bocado de gente e o que restou pra mim dá e sobra.

REPÓRTER - (Toma notas) É a favor da reforma agrária.

ZÉ - É bem verdade que se o meu burro não tivesse ficado doente, eu não tinha feito isso…

REPÓRTER - Mas, e se todos os proprietários de terra fizessem o mesmo. Se o governo resolvesse desapropriar as terras e dividi-las entre os camponeses ?

ZÉ - Seria muito bem feito. Cada um deve trabalhar o que é seu.

REPÓRTER - (Ofensiva) É contra a exploração do homem pelo homem. O senhor pertence a algum partido político ?

ZÉ - (Com alguma vaidade, dissimulada num sorriso modesto) Já quiseram me fazer vereador… qual…

ROSA - O que atrapalhou foi o burro.

REPÓRTER - O burro ? Por quê ?

ROSA - Aonde ele vai, o burro vai atrás. Se ele fosse eleito, o burro também tinha que ser…

REPÓRTER - É, mas desta vez, “seu”…

ZÉ - Zé-do-Burro, seu criado.

REPÓRTER - …“seu” Zé-do-Burro, o senhor será eleito com burro e tudo. (Confidencial) Escute aqui, será que essa história da promessa não é um golpe para impressionar o eleitorado ?

ZÉ - (Ofendido) Golpe ?!

REPÓRTER - E de mestre ! Avalio a agitação que o senhor fez com isso. Pelas estradas, no caminho até aqui, deve ter-se juntado uma verdadeira multidão para vê-lo passar.

ZÉ - É, tinha…

ROSA - Muito moleque também.

REPÓRTER - E imaginem a volta ! A chegada à sua cidade, em carro aberto, banda de música, foguetes !

ZÉ - O senhor está maluco ? Não vai haver nada disso.

REPÓRTER - Vai. Vai porque o meu jornal vai promover. Só faço questão de uma coisa : que o senhor nos dê a exclusividade. Que não conceda entrevistas a mais ninguém. (Noutro tom) É claro que o senhor terá uma compensação… (Faz com o indicador e o polegar um gesto característico) e também a publicidade. Primeira página, com fotografias, o senhor e sua senhora… mandaremos fotografar também o burro - em poucas horas o senhor será um herói nacional.

ZÉ - (Profundamente contrariado) Moço, eu acho que o senhor não me entendeu .. ninguém ainda me entendeu…

REPÓRTER - (Sem lhe dar atenção) O diabo foi o senhor ter escolhido um dia como o de hoje. Sábado. Amanhã é domingo, o jornal não sai. Só segunda-feira. E o nosso Departamento de Promoções precisaria preparar a coisa… Podemos dar o furo na edição de hoje, mas o barulho mesmo só segunda-feira. Quando o senhor pretende voltar ?

ZÉ - Por mim, já estava de volta. Abre-se parcialmente a porta da igreja. O Sacristão deixa o Guarda passar e torna a fechá-la. O Guarda vem ao encontro de Zé-do-Burro, que o aguarda sem muita esperança.

GUARDA - (Balança a cabeça, desanimado) Não consegui nada.

ZÉ - O senhor falou com o padre ?

GUARDA - Falei, argumentei… não adiantou. E ainda tive que ouvir um sermão deste tamanho. Ele acha que, em vez de ir pedir para deixar o senhor entrar na igreja, eu devia era levá-lo preso. Claro que eu não vou fazer isso, mas o senhor bem que podia ter arranjado uma promessinha menos complicada.

ROSA - Também acho.

GUARDA - Porque não adianta o senhor ficar aqui ; o padre já disse que não abre a porta e não abre mesmo - eu conheço ele.

REPÓRTER - Ótimo ! Mas isso é ótimo ! Assim temos um pretexto para adiar a entrega da cruz para segunda-feira. Dará tempo então de organizarmos tudo. As entrevistas, as apresentações no rádio… e a sua volta triunfal com batedores e banda de música !

ZÉ - (Cada vez mais contrariado e mais infeliz) Moço, eu vim a pé e vou voltar a pé.

ROSA - (Ela vislumbrou nas palavras do Repórter uma possibilidade confusa de libertação, ouviu-as num entusiasmo crescente) Oxente ! Não seja estúpido, homem ! O moço está querendo ajudar a gente.

ZÉ - Então ele que me ajude a convencer o vigário a abrir a porta…

REPÓRTER - Eu vou já entrevistar o vigário. Mas fique certo de uma coisa : seja qual for o seu objetivo, uma publicidadezinha não fará mal algum… (Pisca o olho para Zé-do-Burro, que não percebe a insinuação) Carijó, bata mais uma chapa. (Para Zé-do-Burro) Quer fazer o favor de carregar a cruz ? (Para Rosa) A senhora também. Zé-do-Burro fica indeciso, sem palavras para traduzir a sua indignação.

ROSA - Vamos, Zé ! (Empurra-o para baixo da cruz e coloca-se a seu lado, numa atitude forçada)

O Guarda também procura, discretamente, aparecer na fotografia. A cena é caricatural, com Rosa escancarando-se num sorriso de dentifrício, Zé-do-Burro vergado ao peso da cruz e de sua imensa infelicidade. E o Guarda, de peito estufado, disputando honrosamente a sua participação no acontecimento.

GALEGO - (Sai da venda, apressado e dirige-se ao Fotógrafo) Um momento ! O senhor não podia fazer aparecer também o meu estabelecimento ? Sabe… uma publicidadezinha…
(Fotógrafo coloca-se de molde a aparecer, no fundo, a venda. Galego corre para junto do balcão e posa. )

REPÓRTER - Ótimo. Pode bater, Carijó. O Fotógrafo bate a chapa.

REPÓRTER - Obrigado. Esta vai sair hoje na primeira página. (Para o Fotógrafo) Vamos agora entrevistar o vigário.

GUARDA - É melhor o senhor ir pela porta da sacristia.

ZÉ - Eu levo o senhor até lá.

REPÓRTER - (Não gosta da idéia) Não, acho melhor o senhor esperar aqui…

ZÉ - (Com decisão) Mas eu quero ir com o senhor.

REPÓRTER (Cede, de má vontade) Está bem. (Sai, com Zé-do-Burro e o Fotógrafo) Ouvem-se buzinas insistentes.

GUARDA - Garanto que agora o padre vai abrir a igreja. Não há quem não tenha medo da imprensa. (Olha na direção da direita). Eu vou pra lá, que a coisa está piorando. (Sai pela direita).

***

Bonitão desce a ladeira e pára na vendola. Rosa o vê e não esconde a sua emoção.

BONITÃO - (Para o Galego) Uma dupla.

GALEGO - Olá, Bonitão. Usted por aqui “de madrugada”… (Serve a cachaça).

ROSA - (Vai à venda e encosta-se no balcão, ao lado de Bonitão) Um café, moço.

BONITÃO - Ainda ?…

ROSA - Ainda.

BONITÃO - Não sei como você agüenta.

ROS - A Eu também não.

BONITÃO - Ele desconfiou de alguma coisa ?

ROSA - Nada. Ele só pensa na cruz e na promessa,

BONITÃO - Sabe que eu fui pra casa dormir e não consegui ?

ROSA - Por quê ?

BONITÃO - Fiquei pensando em você.

ROSA - Melhor que não pense.

BONITÃO - Está arrependida ?

ROSA - Estou.

BONITÃO - Agora é um pouco tarde.

ROSA - Não é não. Uma noite a gente pode apagar.

BONITÃO - A gente pode apagar uma porção de noites. Isso não deixa marca.

ROSA - Em mim deixou. Nem sei como ele não vê. Dá até raiva. Dá vontade de contar tudo.

BONITÃO - Não é má idéia. Ele não é homem violento. Podia era largar você aqui na cidade e voltar sozinho pra roça. Isso resolvia tudo.

ROSA - Resolvia o quê ?

BONITÃO - Sua vida. Você tem futuro.

ROSA - Adianta não. Minha sina é essa mesma. Às vezes eu tenho vontade, sim, de arrumar a trouxa e ganhar a estrada. Mas não tenho coragem. E se tivesse, não ia saber pra onde ir…

BONITÃO - Quando eu era menino, fui guia de cego…

ROSA - Não estou cega. E sabia muito bem o que estava fazendo. Como sei também que sou capaz de fazer de novo, se ele não me levar daqui. Mesmo sem querer.

BONITÃO - Se você não se livrar dele, vai acabar idiota como ele.

ROSA - (Procurando uma justificativa para sua falta de coragem) Ele precisa de mim.

BONITÃO - Ele tem o burro.

ROSA - Estúpido !

BONITÃO - Não quis comparar…

ROSA - Ele é muito homem, fique sabendo !

BONITÃO - Se é assim, por que você tem tanta sede ?…

ROSA - (Ela se sente cada vez mais empurrada para ele, como para um abismo, e não há nela, precisamente, um desejo de resistir ao salto definitivo. Há apenas a imensa fraqueza da pessoa humana no momento das grandes decisões) Que tinha você de aparecer aqui de novo ?

BONITÃO - Foi você quem veio falar comigo.

ROSA - Você me obriga a fazer o que eu não quero.

BONITÃO - (Ri, cônscio de seu poder de sedução) Que culpa tenho eu de ter nascido com tantas qualidades ?
Ela vai voltar ao centro da praça. Ele a segura pelo braço.

BONITÃO - (Baixo) Espere…

ROSA - (Idem) Está louco ?

BONITÃO - Pelo jeito, ele ainda vai ficar muito tempo aí. Entendeu ?

ROSA - (Solta-se dele com um safanão) Não entendo nada. Você é doido e eu estou ficando doida também.

BONITÃO - Ele não pode sair de junto da cruz. Mas você pode… pode ir descansar no hotel… ou mesmo ir rezar em outra igreja, pedir a outro santo pra ajudar a convencer o padre a abrir a porta… Um reforço sempre é bom…

***

Entra Zé-do-Burro. Rosa e Bonitão disfarçam.

MINHA TIA - (Detendo-o) E então ?…

ZÉ - Eles não quiseram que eu entrasse. Acham melhor falar com o Padre em particular…

MINHA TIA (Assume uma atitude de extrema cumplicidade) Meu filho, eu sou “ekédi” no candomblé da Menininha. Mais logo o terreiro está em festa. Você fez obrigação pra Iansan, Iansan está lá pra receber !

ZÉ (Ele não entende) Como ?

MINHA TIA Eu levo você lá ! Você leva a cruz e a santa recebe ! Você fica em paz com ela !

ZÉ Iansan…

MINHA TIA Foi ela quem lhe atendeu !

ZÉ Mas a igreja…

MINHA TIA Mande o padre pro inferno ! Leve a sua cruz no terreiro ! Eu vou com você !

ZÉ (Hesita um pouco e por fim reage com veemência) Não, não foi num terreiro que eu disse que ia levar a cruz, foi numa igreja. Numa igreja de Santa Bárbara.

MINHA TIA Santa Bárbara é Iansan. E Iansan está lá ! Vai baixar nos seus cavalos ! Vamos !

ZÉ Não. Não é a mesma coisa. Não é a mesma coisa. Abre-se a porta da igreja e surgem Repórter, Fotógrafo e Sacristão.

REPÓRTER (Para o Sacristão) O senhor acha que o padre não deixa mesmo ele entrar ?

SACRISTÃO O senhor não ouviu ele dizer ? É Satanás ! Satanás sob um dos seus múltiplos disfarces !

REPÓRTER Satanás disfarçado em Jesus Cristo… acho que é um pouco forte. Em todo caso, isso é lá com ele. Eu confesso que não sou muito entendido na matéria. O que interessa é mantê-lo aqui, pelo menos até segunda-feira. Se for preciso, mandarei vir comida e bebida. Contanto que ele não vá embora antes de segunda-feira. Zé-doBurro dá um passo em direção à igreja. Sacristão assusta-se.

SACRISTÃO Com licença, senhores, com licença. (Entra e fecha a porta, precipitadamente). Fotógrafo vai à vendola.

REPÓRTER (Vindo a Zé-do-Burro) Nada feito, meu camarada. O padre é uma rocha. (Procura estimulá-lo a resistir) Mas ele vai acabar cedendo. Se você não arredar pé daqui, ele vai ter que abrir a igreja. Eu lhe garanto. Agora a causa não é somente sua, é também do nosso jornal. E sendo do nosso jornal, é do povo !
Zé-do-Burro olha-o como se procurasse inutilmente entender um ser vindo de outro planeta.

REPÓRTER Eu o aconselho a resistir. Afinal de contas, é um direito. Direito que o senhor adquiriu em 42 quilômetros de “via crucis”. Eu confio no senhor. (Para Rosa) Leia o meu jornal hoje à tarde. Vai ser um estouro. (Sai seguido do Fotógrafo)

BONITÃO Jornalistas, é ?

ROSA É. (Com vaidade) Tiraram o meu retrato. Será que vão publicar mesmo ?

BONITÃO Se estivesse nua, eu garantia. Assim… não sei. Neste momento, entra Marli pela direita. Ao ver Bonitão junto a Rosa, avança para ele em atitude agressiva.

MARLI Eu sabia !… Tinha que estar atrás de algum rabo-de-saia !

BONITÃO Que é que você vem fazer aqui ?

MARLI Venho saber por que o senhor não apareceu em casa esta noite.

BONITÃO Que casa ?

MARLI A minha casa.

BONITÃO Estava indisposto. Fui para o meu hotel.

MARLI (Mede Rosa de alto a baixo) Sim, eu estou vendo a sua “indisposição”.

BONITÃO (Em voz contida, mas enérgico) Não faça escândalo !

MARLI Por quê ? Está com medo do marido dela ?

BONITÃO Não estou com medo de ninguém, mas não vou deixar você fazer a senhora passar vexame.

MARLI (Irônica) A senhora… se ela é senhora, eu sou donzela…

BONITÃO (Autoritário) Marli, me obedeça !

MARLI Está querendo bancar o machão na frente dela, é ?

BONITÃO Eu não tenho nada com ela !

MARLI Você passou a noite com ela ! O rosto de Zé-do-Burro se cobre de sombras e ele busca nos olhos de Rosa uma explicação. Ela não o fita.

BONITÃO (Segura Marli por um braço, violentamente) Vamos para casa !

MARLI Não ! Primeiro quero tirar isso a limpo. Quero que essa vaca saiba que você é meu. (Com orgulho) Meu ! (Grita para Rosa) Esta roupa foi comprada com o meu dinheiro ! Esta e todas as que ele tem !

BONITÃO (Perde a paciência, ameaçador) Se você não for para casa imediatamente, nunca mais eu deixo você me dar nada !

MARLI (Deixando-se arrastar por ele na direção da direita) Ele é meu, ouviu ? Fique com seu beato e deixe ele em paz ! É meu homem ! É meu homem !

Há uma pausa terrivelmente longa, na qual Zé-do-Burro apenas fita Rosa, silenciosamente, sob o impacto da cena. Em seu olhar, lê-se a dúvida, a incredulidade e sobretudo o pavor diante de um mundo que começa a desmoronar. As luzes se apagam em resistência.

Língua

Ditado - Correção

Le film

O Pagador de promessas - No cinema

Palma de Ouro

O Filme

Tipologia das personagens - Análise fílmica

Adaptation cinématographique - Cinema : Análise

Comparação entre o texto - obra literária - e a adaptação cinematográfica : diferentes compreensões do texto

a) Personalidade das quatro primeiras personagens :

  • aspeto psicológico, moral, religioso
  • aspeto social

b) Interpretação das indicações cênicas:Diferenças ? :

  • O cenário (igreja, degraus, ruas, "Castelo", noite, dia…)
  • Os acessórios : a cruz…
  • O vestuário : vestidos das mulheres : Rosa que vem do campo =/= Marli que trabalha como prostituta ; …dos homens : o "pagador de promessas" = homem simples do campo =/= Bonitão, o "cafetão" que cuida da aparência, graças ao dinheiro que recebe das mulheres… Para servir uma crítica ? Objetiva ? Subjetiva ?

C) Cena seguinte : do "hotel do padre" ao outro hotel…

Rosa  : Uma vítima. Respeita o marido, apesar de considerar a sua promessa vã. Segue-o, tenta o convencer da inutilidade disso tudo, mas… Entre resistência e tentação (cama de molas, descanso, mas não só…) = uma mulher bem consciente dos perigos da vida, sem ingenuidade, incrédula, e que não queria se arriscar a enganar o marido… = um ser que já não aguenta uma condição e que se deixa cair noutra, talvez pior…

Zé-do-Burro : Um crente. Impossibilidade de "abandonar a cruz", (altamente simbólica), incapaz de entender o que lhe diz sua mulher, de compreender o objetivo de Bonitão = um ser ingênuo, cego mas determinado e honesto, fiel à palavra dada.

Bonitão : Um homem sem escrúpulos, descrente e sem moralidade, esperto, que sabe "ler nas pessoas" e se aproveitar delas… = um "malandro"

Marli  : Uma vítima. Ama o "protetor", apesar de ter consciência de seus defeitos. Não tem outra opção… Solteira, sem filhos nem esperança de viver de outro modo… = um ser que sofre…

Teatro

Representação teatral - Análise

O Gênero dramático

Mapa mental de Quéren

Vocabulário do teatro

Fonte : https://portaldosatores.com/2014/12/05/dicionario-de-teatro/

Caméra…

Linguagem cinematográfica

Movimentos no quadro

Movimentos no quadro :

Fonte : http://www.primeirofilme.com.br/site/o-livro/movimentos-no-quadro-da-camera-e-da-objetiva

ENTRADA EM QUADRO (pela esquerda) e SAIDA DE QUADRO (pela direita)

Candomblé ?

Ir mais longe… O Candomblé

O Candomblé

Dentre as nações africanas praticantes do animismo, cada uma tinha, como base, o culto a um único orixá. A junção dos cultos é um fenômeno brasileiro em decorrência da importação de escravos onde, agrupados nas senzalas, nomeavam um zelador de santo, também conhecido como babalorixá no caso dos homens e iyalorixá no caso das mulheres.

Diz Clarival do Prado Valladares em seu artigo "A Iconologia Africana no Brasil", na Revista Brasileira de Cultura (MEC e Conselho Federal de Cultura), ano I, Julho-Setembro 1999, p. 37, que o "surgimento dos candomblés com posse de terra na periferia das cidades e com agremiação de crentes e prática de calendário verifica-se incidentalmente em documentos e crônicas a partir do século XVIII". O autor considera difícil para "qualquer historiador descobrir documentos do período anterior diretamente relacionados à prática permitida, ou sub-reptícia, de rituais africanos". O documento mais remoto, segundo ele, seria de autoria de dom Frei Antônio de Guadalupe, bispo visitador de Minas Gerais em 1726, divulgado nos "Mandamentos ou Capítulos da visita".

Surgido na Bahia em meados do século XIX, é religião de matriz africana das mais difundidas no Brasil. O termo é uma junção do termo quimbundo candombe (dança com atabaques) com o termo iorubá ilê (casa) : "casa da dança com atabaques". A religião tem por base o culto às forças da natureza, sendo chamada de animista.

Como os africanos escravizados eram provenientes de diversos povos e regiões, suas religiosidades evoluíram na forma de diversas tradições : são as chamadas "nações do candomblé", que se distinguem entre si principalmente pelas divindades veneradas, os atabaques, os cânticos e a língua litúrgica usada nos rituais.

https://pt.wikipedia.org/wiki/Candombl%C3%A9

Festa de Santa Bárbara

https://pt.wikipedia.org/wiki/Festa_de_Santa_B%C3%A1rbara

Religião e crítica social :

https://www.academia.edu/389832/SINCRETISM_IN_O_PAGADOR_DE_PROMESSAS_BY_DIAS_GOMES

Resumo

Um resumo bem legal !

Análises

Trabalhos de alunos

Análises & resumos

Paulo

Paulo

Ato 3 - O Pagador de Promessas

O último ato começa com uma Roda de Capoeira. Entre cantos e danças-lutas, se divertem frente a [26] venda de Galego. Que se encerra na anunciação da venda do Caruru de Minha Tia ; Dando novamente palco a trama do protagonista, Zé do Burro que discute com sua esposa inquieta de seu destino e insiste em ir o quanto antes.

Zé persiste em cumprir sua promessa e permanece. O perigo já se anuncia [27] pela chegada de Secreta que foi tão rápida quanto sua ida. Rosa em desespero busca a todo custo então encontrar Bonitão, responsável de uma denúncia contra Zé do Burro. As realidades se entrelaçam : Marli em uma troca de farpas quase letal com Rosa, o repórter anunciando seus presentes, que [28] assim como a polícia acredita que a [29] martírio de Zé tem simbólica política. Rosa parte ao encontro de Bonitão na esperança de voltar atrás mas já era [30] tarde demais. A polícia chegou ; [31] De um lado Zé, os capoeiristas e Mestre Coca. Doutro, o Delegado, Secreta e o Padre.

Zé do Burro morre na praça após tentar buscar a faca que estava em suas mãos [32] ; sufocado pelo peso dos policiais e dos capoeiristas buscando [33] defender, se fere [34] e morre. Os capoeiristas então levam o corpo de Zé sob a cruz, igreja adentro.

Opinião

Ao meu ver, a obra por sua didática permite uma análise mais profunda e variada. Ainda que seja sobre um camponês que ao tentar pagar uma promessa, é vítima de olhos maliciosos e pessoas má [35] intencionadas. Em uma análise a obra pode expressar teor político, social em seus personagens, o que me deu gosto ao ler. O repórter enquanto o poder mediático, o padre o poder da igreja, Bonitão enquanto os perigos da sociedade…

Entretanto, um final trágico de um personagem, inocente, ressalta revolta porém também consciência. Revolta ao ver uma injustiça ocorrendo a alguém de coração puro, porém permanecendo necessária para entendermos a mazela que ronda os humilhados, camponeses, pela elite religiosa, mediática e sua influência nas decisões da lei como vimos com o Delegado e a corrupção que há por trás da Lei, como vimos com Secreta [36].

Uma leitura simples, rápida e prazeroso [37] porém muito mais que uma simples narração socio-religiosa, que necessita de uma análise para ressaltar seu pleno potencial.

Gabriella

Gabriella

Resumo Ato 2

MORAES FRANCO GABRIELLA TG2
SEGUNDA-FEIRA 25 DE JANEIRO DE 2021
TRABALHO DE LITERATURA
RESUMO DO ATO 2 : O PAGADOR DE PROMESSAS

Une lecture minucieuse, approfondie, de l’Acte 2. Bravo. - Vous n’avez pas laissé grand-chose de côté ! Mais s’agit-il réellement d’une contraction de texte ? Le résumé ne doit pas entrer dans les détails. Il doit aller à l’essentiel, de façon très claire.
D’un point de vue linguistique et syntaxique, attachez-vous à réduire vos phrases et surtout à les ponctuer. Mieux vous ponctuerez, plus vous serez claire et moins vous commettrez d’erreurs de concordance des temps…
Essayez de retrancher tout ce que j’ai surligné en rouge, de refaçonner vos phrases et comparez…15

Antes Depois
As coisas não estavam se saindo do jeito que Zé do Burro previu, após o padre descobrir que a tal promessa feita por Zé do Burro foi feita em terreiro de candomblé, ele resolve então fechar as portas da igreja. O que deixa algumas pessoas que passavam por lá curiosas pois o padre sempre teve a fama de ser bom e de ajudar os pobres.
As 8h30 da manhã chega um Guarda para interrogar Zé do burro, que por
sua vez já está irritado com todos os acontecimentos q ocorreram mais cedo.
Mas mesmo assim decide explicar sua situação para o guarda na esperança
de receber alguma ajuda. O guarda então para encerrar o caso decide então ajudar o Zé, ele se adianta então até a porta da igreja para tentar razoar o padre. Enquanto o Guarda entra para tentar conversar com o padre, aparece bruscamente uma mulher bem apressada descendo a ladeira, ao se aproximar mais um pouco podemos identificar que era Rosa.
Rosa parecia distante e não estava muito interessada no que havia acontecido em sua ausência, ela repentinamente começou a persuadir Zé a ir embora, em vão. Zé queria porque queria cumprir sua promessa, então ficou na frente da porta da igreja aguardando a resposta do Guarda, enquanto ele esperava por alguma notícia resolveu perguntar a Rosa como havia sida a noite dela no hotel, ela com poucas palavras respondeu que tinha sido uma noite agradável e que o senhor que conseguiu o tal quarto de hotel havia sido muito prestativo e amável. Zé sem desconfiar de nada, ficou feliz por sua esposa ter descansado um pouco.
As coisas não estavam se saindo do jeito que Zé do Burro tinha previsto.
Após o padre descobrir que a promessa tinha sido feita em terreiro de candomblé, ele resolveu fechar as portas da igreja.
Um Guarda interroga Zé do burro que, já irritado, explica sua situação. O guarda decide então ajudar o Zé, tentando razoar o padre. Entretanto aparece a Rosa que tenta persuadir Zé a ir embora, mas em vão.
Zé, sem desconfiar de nada, ficou feliz por sua esposa ter podido descansar
um pouco…

As coisas não estavam se saindo do jeito que Zé do Burro previu [38], após o padre descobrir que a tal promessa feita por Zé do Burro foi feita em terreiro de candomblé, ele resolve então fechar as portas da igreja. O que deixa algumas pessoas que passavam por lá curiosas pois o padre sempre teve a fama de ser bom e de ajudar os pobres.
As 8h30 da manhã chega um Guarda para interrogar Zé do burro , que por sua vez está irritado com todos os acontecimentos q [39] ocorreram mais cedo. Mas mesmo assim decide explicar sua situação para o guarda na esperança de receber alguma ajuda. O guarda então para encerrar o caso decide então [40] ajudar o Zé, ele se adianta então até a [41] porta da igreja para tentar razoar o padre. Enquanto o Guarda entra para tentar conversar com o padre, aparece bruscamente uma mulher bem apressada descendo a ladeira, ao se aproximar mais um pouco podemos identificar que era Rosa. Rosa parecia distante e não estava muito interessada no que havia acontecido em sua ausência, ela repentinamente começou a persuadir Zé a ir embora, em vão. Zé queria [42] porque queria cumprir sua promessa, então ficou na frente da porta da igreja aguardando a resposta do Guarda, [43] enquanto ele esperava por alguma notícia [44] resolveu perguntar a Rosa como havia sida a noite dela no hotel, [45] ela com poucas palavras respondeu que tinha sido uma noite agradável e que o senhor que conseguiu o tal quarto de hotel havia sido muito prestativo e amável. Zé sem desconfiar de nada, ficou feliz por sua esposa ter descansado um pouco.
Enquanto o casal conversa, apareceu [46] repentinamente um repórter acompanhado de um fotógrafo que dirigiu se [47] a eles, repleto de curiosidade. Anunciado [48] a todos que Zé do burro era um herói e que logo se tornaria um herói nacional. Zé do burro confuso começou a questionar o porque [49] dele ter se [50] tornado um herói. O repórter por sua vez não lhe cede muita importância e começa com suas perguntas, pergunta na qual [51] Zé do burro tinha o prazer em não responder. Mas Rosa por outro lado vendo vantagens nesta situação, responde com muito gosto a todas as perguntas feitas ao marido. Um fato que mais chamou a atenção do repórter foi do porque [52] dele ter dividido o seu sítio com outros lavradores, [53] ele então ficou ansioso em saber se Zé do Burro era ou não a favor da reforma agrária. Assim que o repórter formulou a sua pergunta [54] Zé ficou intrigado pois não fazia ideia do que era a reforma agrária, e em poucas palavras o repórter explicou que a reforma agrária seria o fato de repartir de forma equitativa as terras.
Zé do burro respondeu de forma ingeniosamente [55] que seria o certo a se fazer. Enquanto o repórter prosseguia com suas perguntas e ao mesmo tempo procurava vantagens nas respostas dadas por Zé do Burro, o guarda finalmente saia da igreja com um semblante não muito agradável, ele então se aproxima de Zé e lhe explica que infelizmente não havia conseguido convencer o padre a abrir as postas da igreja. Zé ao ouvir esta notícia ficou um pouco desesperançoso mas por outro lado o repórter encheu-se de alegria pois assim ele teria tempo de organizar entrevistas e apresentações na rádio, apresentações que fariam com que ele faturasse uma boa quantia de dinheiro. Percebendo que esta situação iria durar por mais alguns dias decidiu alargar sua matéria entrevistando o padre. Porém antes de tentar entrar na igreja ele adianta sua foto para a primeira página do jornal chamando todos os envolvidos. Todos se desagregam e Zé do burro vê uma oportunidade de finalmente entrar na igreja junto ao déposter [56] e fotógrafo. Vinha de longe Bonitão descendo a ladeira em direção a uma vendóla [57], [58] Rosa imediatamente se precipita e vai em direção a ele. Os dois começam a conversar e o diálogo entre os dois dá a entender que aconteceu algo a mais naquele quarto de hotel, algo que Rosa não tinha coragem de contar a seu marido, uma ação na qual ela estaria muito arrependida.
Bonitão não se importando com a atitude do marido de Rosa e sabendo os desejos de Rosa [59] tenta persuadir ela a enganar o seu marido e voltar para aquele quarto de hotel. Do nada Zé do Burro reaparece com um olhar entristecido dizendo que não pode entrar na igreja, [60] uma mulher que estava observando a situação de Zé decide então oferecer ajuda, [61] está [62] mulher era Minha tia sua proposta [63] era simples “ Zé poderia levar a cruz e mum [64] terreiro de Iansan, um terreiro de candomblé que ela mesma conhece “ [65]. Zé pensativo recusou sua oferta alegando que na sua promessa ele deveria levar a cruz até o alta [66] da igreja de Santa Bárbara.
Surgi [67] então o Repórter que por sua vez também não conseguiu convencer o padre mas que se Zé do Burro a continuar insistindo que cedo ou tarde o Padre iria ceder [68]. Enquanto os dois conversavam, Marlí aparece [69] indignidade [70] com o fato de Bonitão ter passado a noite fora e alegou que ele que ele [71] não voltou pois preferiu passar a noite com Rosa. Ao escutar isso, Zé do Burro ficou sem palavras, [72] as horas passavam e Zé do Burro com tantos problemas e com a insegurança de ter sido traído por Rosa, tratava-a com uma certa frieza. Ao ler a matéria escura sobre ele deparou se [73] com o oposto do que ele havia dito. Com todos estes acontecimentos ele acaba por se questionar, ele acaba se convencendo de que tudo aquilo é uma forma “ de experimento ” para ver se ele cumpriria sua promessa.
E mais uma vez surge Bonitão só que desta vez com um plano de mandar prender Zé do Burro e assim ele poderia se aproveitar de sua Rosa, [74] ele então convence o policial, Secreta, da credibilidade da versão do jornal.
Farto de toda aquela situação Zé do Burro começa a gritar em frente à porta da igreja na expectativa de chamar a atenção do padre. O padre resolve então abrir a porta e em busca de uma solução para resolver toda aquela situação acaba culpando o burro. Surge então o Montsenhor [75] Otavia do que estava vindo a mando do Arcebispo.
Os três então entram na igreja para conversar e Zé do burro fica do lado de fora com a esperança de enfim cumprir sua promessa é [76] então voltar para casa mas infelizmente mais uma vez as coisas não saíram do jeito em que Zé do burro planejou. O Monsenhor fez uma proposta bem simples a Zé do burro, ele deveria jogar fora a Cruz e esquecer essa tal promessa pedindo perdão a Deus. Zé refletiu por alguns minutos e recusou, não havendo outra solução para este caso o Monsenhor se retira, as portas da igreja se fecham e Zé volta à estaca zéro, ele entrou [77] se senta e começa a chorar.

Bianca

Bianca

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[1Didascália – Instrução do Didascal aos seus intérpretes. Diz-se das indicações cênicas dadas fora do texto, separadas das réplicas.

[2Descrição objetiva e subjetiva :
A descrição objetiva apresenta a cena (ou o objeto, a paisagem, a personagem, a situação…) de forma concreta, se aproximando da realidade, deixando de lado as impressões de quem observa. Apresenta características como : luz, cor, forma, tamanho, peso, espessura, volume, etc.
A descrição objetiva preocupa-se com a exatidão dos pormenores (detalhes) e com a precisão das palavras.
Pelo contrário…
A descrição subjetiva apresenta o objeto de maneira transfigurada, deixando livre curso a sensibilidade do observador. A cena, a personagem, os objetos são descritos da maneira como são vistos e sentidos. O observador exprime a sua emoção em relação ao objeto.
Não se preocupa com a exatidão do que é descrito, o importante sendo a transmissão das impressões que ressente, mais do que a realidade observada.

[3O pano : Le rideau

[4O cenário  : Le décor.

[5Linha da ribalta : Sous les projecteurs.

[6A platéia  : Le Public.

[7Sobrados coloniais : Maisons (de ville) coloniales.

[8Degraus  : Marches (degrés).

[9Esquina  : Coin, angle de la rue, côte, montée, pente.

[10O pronome relativo cujo é usado para indicar a noção de posse. Relaciona dois substantivos, indicando que o substantivo anterior tem a posse do substantivo posterior : "… o sobrado cuja fachada…" = a fachada do sobrado.
O uso do pronome relativo cujo permite evitar a repetição dos termos da oração, relacionando-os e sintetizando-os.
Pode atuar como adjunto adnominal ou complemento nominal, introduzindo orações subordinadas adjetivas.

[11Os atabaques : Atabaque, Tambour

[12Candomblé  : Candomblé, Religion, rituel

[13O toque de Iansan : Iansan, divinité (culte animiste).

[14Légua = Cinco quilômetros

[15Armarinho = Mercier

[16Oxente  ! Termo usado, principalmente na região nordeste do Brasil, para expressar surpresa, exclamação.

[17Cochilar = Somnoler, s’assoupir

[18Aviltamento = Avilissement

[19Pele trigueira = pele morena, que tem a cor do trigo maduro. Très mate, burinée.

[20Posseiro é a pessoa que detém a posse legal de um bem imóvel. Os posseiros são lavradores (agricultores) que, juntamente com a família, ocupam pequenas áreas de terras devolutas ou improdutivas, isto é, terras que não estão sendo utilizadas e que pertencem ao governo. São trabalhadores rurais que têm a posse, mas não têm um documento oficial que prove que eles são donos ou proprietários da terra.
O maior número de conflitos pela posse da terra envolve os posseiros e grileiros.
Posseiros são trabalhadores rurais que ocupam um pedaço de terra sem possuir o título de propriedade, onde passam a praticar uma agricultura de subsistência utilizando o trabalho da própria família. Os grileiros são, geralmente, grandes empresas ou fazendeiros que se utilizam da força e da violência para se apropriar de terras devolutas ou terras trabalhadas por posseiros. Contratam jagunços (capangas) para "limpar" o terreno, ou seja, expulsar índios e posseiros que, porventura, estejam ali fixados. Conseguem a documentação do imóvel (títulos de propriedade), muitas vezes falsificadas, transformando a terra em objeto de especulação imobiliária ou instrumento de negócios.

[21Fin du dialogue de sourds

[22Gradação da tensão…

[23Frase misteriosa… Zé não está falando do burro Nicolau.

[24Primeiro vez que Zé parece não sofrer…

[25Importância do adjetivo "inquisitorial". Intolerância religiosa / Inquisição

[26Frente à venda

[27É verdade, mas já se trata de uma interpretação pessoal. Resumo = fatos, apenas fatos objetivos, sem opinião, análise ou interpretação pessoal…

[28Mal construído. Esse "que" é longe demais da palavra a que se refere… (Confusão possível com a proximidade da palavra "presentes".)

[29o

[30Presente ou passado ? É preciso escolher…

[31Depois do ponto e vírgula, não há maiúscula…

[32Faca que tinha caido no meio da praça por causa do empurrão do Padre e que ele queria apanhar… Não estava em suas mãos.

[33o

[34"Ouve_se um tiro"…

[35Mal intencionadas

[36E com Bonitão, antigo "Secreta"…

[37prazerosa

[38Tinha previsto - Tempo

[39Evite as abreviaturas num dever…

[40Repetições "então"…

[41Até à porta

[42Falta aqui uma negação…

[43Ponto ! Para deixar "respirar" o seu texto…

[44Use vírgulas para facilitar a leitura…

[45Já devia ser outra frase…

[46Concordância dos tempos

[47Hífen

[48Anunciado ou anunciando ?

[49O porquê

[50Hífen

[51Mal construído

[52porquê (Quando "o porquê" é um nome, um substantivo, leva sempre um acento)

[53Corte as frases.

[54Vírgula

[55engenhosamente

[56repórter

[57vendola

[58Ponto !

[59Vírgula !

[60Nova ideia, nova frase…

[61Ponto !

[62Esta

[63"Cortar" as frases permite organizar as ideias…

[64"em um" ou "num"

[65Só uma citação precisa pode apresentar valor e interesse…

[66O altar

[67Surge

[68Frase incorreta, mal construída

[69Concordância dos tempos

[70Indignada

[71Pense em reler…

[72Corte !!!

[73Falta pontuação…

[74Corte !

[75Monsenhor

[76e

[77então ?

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